O diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista vem aumentado significativamente em uma sociedade que ainda está aprendendo a lidar com esta deficiência. Por outro lado, o Direito Social tem o dever de amparar, seja criança ou adulto, inclusive, com a concessão do Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social, o qual abordaremos neste artigo.
Transtorno do Espectro Autista ou TEA é um transtorno do neurodesenvolvimento, ou seja, algumas funções neurológicas não se desenvolvem como deveriam nas respectivas áreas cerebrais das pessoas acometidas por ele. Fato é que cada pessoa com TEA tem sua particularidade, pois os sintomas são diversos e, além disso, há os níveis de suporte 1, 2 ou 3 de acordo com a reação da deficiência em cada individuo.
Já o Benefício de Prestação Continuada – BPC é um benefício assistencial, um Direito Fundamental garantido pela Constituição Federal em seu art. 203, V e pela LOAS. O BPC destina-se a pessoa idosa ou com deficiência sendo aquela que tem um impedimento de longo prazo, que enfrenta barreiras, obstáculos e está em desigualdade de condições com os demais em sociedade.
Certo é que existem outros requisitos para o BPC como a comprovação da miserabilidade, registro biométrico e a exigência cadastro único, mas neste artigo, iremos abordar a deficiência da criança com TEA e seu direito de ser amparada pelo benefício assistencial.
Interpretando o Autismo como Deficiência para o BPC
Conforme prevê lei Berenice Pina 12.764/12, em seu art. 1º
§ 2º A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais. Nesta caso, resta portanto, comprovar o impedimento do longo prazo, pois a deficiência é inquestionável.
Em regra, os sintomas do Transtorno do Espectro Autista começam a aparecer nos primeiros anos de vida da criança. As barreiras enfrentadas vão além da deficiência propriamente dita, pois impactam diretamente em sua interação e, principalmente, seu desenvolvimento.
Quando se fala em BPC para crianças com TEA é um exemplo claro que deficiência e incapacidade não se confundem, justamente porque crianças não exercem atividades laborativas. Este é um ponto que muitas vezes gera confusão quando se trata de benefício assistencial para adultos.
O Autismo pode gerar obstáculos relevantes para inclusão social, ainda que a deficiência desta criança não seja física e possa enxergá-la. Estes obstáculos ou barreiras podem impactar diretamente o desenvolvimento emocional, social e aprendizado, o que por consequência, acarreta em uma situação de vulnerabilidade, importante fundamento para a concessão do BPC.
Comprovação do Impedimento e Barreiras
Para se comprovar o impedimento de longo prazo, barreiras e dificuldade de interação social, pode-se valer de documentos certos a fim de demonstrar a exclusão social desta criança, tais como:
Antes de adentrar aos documentos mencionados, importante definir o que seria a exclusão social. A exclusão social é quando identificamos a dificuldade de uma criança com TEA interagir plenamente com o meio social em que vive, seja na família, na escola, em um ambiente social, o que muitas vezes se resulta em preconceito e isolamento. A dificuldade de acesso a planos de saúde, terapias e acompanhamento especializado também pode indicar uma exclusão social da criança.
Baseando nos documentos acima podemos extrair:
Laudos médicos: Laudos ou relatórios médicos e terapêuticos devem indicar como a característica do autismo naquela criança em específico interfere na interação com as demais pessoas, nas atividades diárias, mencionar todos os cuidados necessários para um bom desenvolvimento, seja físico, mental, intelectual ou emocional.
Relatórios escolares: Devem informar como é o comportamento daquela criança dentro da sala de aula ou em brincadeiras com as demais crianças, sua dificuldade com aprendizado pedagógico, as faltas frequentes e necessidade de um suporte pedagógico especializado.
Relatórios de Assistentes Sociais: Tais relatórios podem descrever a ausência de acessibilidade nas escolas, ao tratamento específico de saúde, o ambiente e condição socioeconômica da família.
Gastos com terapias e medicamentos: São essenciais, tanto para demostrar a impossibilidade financeira da família em arcar com os tratamentos e medicações quanto para comprovar a exclusão social daquela criança por demandar tratamentos específicos e de difícil acesso.
Como conseguir tais documentos
Se o assunto é BPC, estamos referindo a famílias que em sua maioria possuem dificuldades de acesso a informações, tecnologias e muitas vezes, um dialeto precário para expressar sua realidade.
Muitos profissionais da saúde já sabem exatamente como o laudo/relatório deve ser elaborado. Contudo, muitas vezes nos deparamos com documentos incompletos que podem prejudicar a análise real para a concessão do benefício para determinada criança.
Neste caso, o advogado especialista, procurador do requerente, deve elaborar uma carta para cada profissional, seja o médico, terapeuta, diretor escolar ou assistente social a fim de explicar os motivos/situação da criança e qual será a finalidade do laudo/relatório ou declaração solicitado.
O momento ideal seria ter acesso a estes documentos antes mesmo do protocolo do requerimento, porém, a depender da situação, deve obrigatoriamente, ser apresentado na perícia médica e incluído pelo advogado no processo.
É importante comparecer a perícia médica com laudos e documentos recentes, constando a confirmação do diagnóstico (CID11 6 A02) e não apenas um diagnóstico sugestivo, como acontece muitas vezes.
Conclusão
O Autismo é uma deficiência por lei, então, cabe ao profissional contratado naquele caso concreto, comprovar, através dos documentos mencionados que aquela criança possui um impedimento de longo prazo que a coloca em desigualdade de condições com outras crianças. Além disso, é importante também demonstrar as barreiras as quais enfrenta e que por tais razões, possui o direito a concessão do benefício.
Essa breve explanação não teve o intuito de esgotar o tema, mas sim de mostrar que a concessão do Benefício de Prestação Continuada é um dever do Estado – previsto na Constituição Federal de 1988 – para amparar as famílias vulneráveis e que se encontram em miserabilidade.
A nós, previdenciaristas especializados, cabe zelar por este cumprimento, com os devidos cuidados e respeito a vida qual foi confiada em nossas mãos.