Você já ouviu falar do "segurado especial"? Esse termo se refere, principalmente, ao trabalhador rural que produz em regime de subsistência, porém tal termo tem sido confundido com miserabilidade, o que não coaduna com o texto posto na norma. A legislação previdenciária brasileira busca proteger esses trabalhadores, mas a realidade nem sempre é simples. Vamos entender melhor essa história?
A Origem da Proteção Social
Para compreendermos a situação atual, é interessante voltarmos um pouco no tempo. A ideia de seguro social surgiu na Europa, com Otto Von Bismarck, que criou a Lei do Seguro Doença. No Brasil, a proteção social para o trabalhador rural começou a ganhar forma com a Lei 4.214/63 (Estatuto do Trabalhador Rural) e se aprofundou com a Lei 11/71 (PRORURAL).
A Constituição Federal de 1988 representou um marco importante, garantindo a inclusão do segurado especial na Previdência Social. Antes disso, a proteção era mais assistencialista do que previdenciária.
O Segurado Especial: Quem é e como contribui?
O segurado especial é aquele que trabalha na área rural, individualmente ou com a família, sem empregados fixos. A propriedade rural explorada tem um limite de tamanho (quatro módulos fiscais), e existem regras sobre o que pode ou não descaracterizar essa condição.
A contribuição previdenciária do segurado especial é feita sobre o resultado da comercialização da produção. Ou seja, é um tributo que incide sobre o que é vendido.
Os Desafios e a Insegurança Jurídica
Apesar dos avanços, o segurado especial ainda enfrenta insegurança jurídica. Uma das questões centrais é a interpretação da capacidade econômica desse trabalhador. Algumas decisões judiciais parecem partir do pressuposto de que a renda do segurado especial é sempre muito baixa, o que nem sempre reflete a realidade.
Outro ponto de debate é o uso de maquinário agrícola. Embora o governo incentive a modernização da agricultura familiar, algumas decisões judiciais veem o uso de máquinas como um fator que descaracteriza o segurado especial.
Impactos
Decisões judiciais que negam benefícios previdenciários a trabalhadores rurais com produção um pouco acima da média ou que utilizam maquinário moderno demonstram como a interpretação da lei pode ser prejudicial.
Essa insegurança tem um impacto direto na vida dos trabalhadores rurais, que ficam sem a proteção previdenciária a que têm direito. Além disso, evidencia um debate que revela falha na interpretação da norma, ao se pôr em xeque se o benefício destinado aos segurados especiais é previdenciário ou assistencial.
O parágrafo 8 do artigo 195 da Constituição Federal não deixa espaço para dúvidas, em razão de seu caráter tributário, o segurado especial contribui para a previdência e, por esta razão, não há o que se falar em assistencialismo no que tange, por exemplo, a aposentadoria por idade rural.
Críticas ao modelo contributivo
Desde a promulgação da Constituição Cidadã, tem-se debatido intensamente sobre o déficit ocasionado pela forma como é dado o custeio dos benefícios destinados aos segurados especiais. A questão do financiamento previdenciário desses trabalhadores rurais sempre causou controvérsia, tanto entre especialistas quanto entre os próprios segurados, devido às especificidades e vulnerabilidades que envolvem a agricultura familiar e a economia rural.
Esse debate tornou-se ainda mais acalorado durante a discussão do texto da reforma da previdência ocorrida em novembro de 2019. Apesar das inúmeras mudanças propostas, os trabalhadores rurais acabaram sendo deixados de fora das alterações legislativas, o que gerou um misto de alívio e preocupação. Enquanto muitos comemoravam a manutenção dos direitos adquiridos, havia também uma crescente inquietação quanto à sustentabilidade do sistema previdenciário em longo prazo.
No entanto, é fundamental reconhecer que o déficit previdenciário não pode ser corrigido pela exclusão daqueles que sempre trabalharam em conformidade com as previsões normativas. A solução para os desafios econômicos e financeiros do sistema previdenciário deve passar por uma abordagem inclusiva e justa, que garanta a proteção social dos trabalhadores rurais sem comprometer a viabilidade da previdência. Excluir cidadãos que contribuíram e se dedicaram ao desenvolvimento do país é uma solução simplista e injusta que não aborda as raízes do problema.