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A polêmica Medida Provisória nº 446/2008, sobre certificado das entidades beneficentes de assistência social, continua surtindo efeitos

Kiyoshi Harada - jurista, professor e especialista em Direito Financeiro e Tributário pela USP


Nota de atualização (do Editor): na noite do dia 10/02/2009, a Medida Provisória nº 446, de que trata o presente artigo, foi rejeitada pelo plenário da Câmara.


A Medida Provisória nº 446, de 7-11-2008, foi devolvida ao Executivo pelo Presidente do Congresso Nacional a pretexto de que contraria preceitos éticos e morais, ao que se depreende das entrevistas dadas, na época, por aquela autoridade legislativa.

Na verdade, não existe previsão constitucional de devolução de medida provisória. A medida provisória entra em vigor assim que editada pelo Presidente da República, perdendo a eficácia se não convertida em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável uma vez por igual período, na hipótese de as duas Casas do Congresso Nacional não terem encerrado a sua votação nos primeiros sessenta dias, a contar de sua publicação (§§ 3º e 7º do art. 62 da CF).

Essa prorrogação é automática, bastando simples decurso do prazo sem votação conclusiva no Senado Federal e na Câmara dos Deputados.

Se a medida provisória não se converter em lei, no prazo de cento e vinte dias, ou se ela for rejeitada pelo Congresso Nacional, perderá eficácia ex tunc, isto é, desde a sua edição. Nesta hipótese, cabe ao Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas dela decorrentes, no prazo de sessenta dias, a contar da data da rejeição ou de sua caducidade, sob pena de consolidação definitiva daquelas relações jurídicas geradas durante sua vigência (§§ 3º e 11 do art. 62 da CF).

Na hipótese de inércia do Legislativo, a Medida Provisória nº 446/2008 continuará produzindo seus efeitos até 6 de março de 2009. Por isso, o CNAS vem deferindo, aos milhares, os pedidos de renovação de CEBAS pendentes de julgamento definitivo na data da edição da Medida Provisória em questão. Na verdade, aquele instrumento normativo, atropelando o princípio do devido processo legal, considerou renovados os aludidos certificados.

O Projeto de Lei nº 462, de 1-12-2008, de iniciativa do Legislativo, para substituir a medida provisória acoimada de imoral, também valida a renovação automática dos certificados até 31-12-2009, ou até a data do julgamento dos pedidos de renovação.

Essas renovações automáticas, que vêm sendo concedidas pelo CNAS habilitam os beneficiários a pleitearem o imediato cancelamento administrativo ou judicial de débitos previdenciários oriundos da ausência de CEBASs em vigor. De fato, o art. 2º da Resolução nº 7, de 3 de fevereiro de 2009, do CNAS, que publicou os deferimentos dos pedidos de renovação de que trata o art. 37 da MP nº 446/2008 prescreve que a publicação em questão "substitui, para todos os efeitos, o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, em papel, antes expedido pela Presidência do Conselho Nacional de Assistência Social".

Uma vez cancelados esses débitos, a eventual caducidade ou a rejeição da medida provisória, com efeito ex tunc, não prejudicarão os efeitos gerados durante a sua vigência, isto é, o cancelamento de débitos, tornar-se-ão definitivos caso o Congresso Nacional não os discipline por decreto legislativo. Na prática, nunca se viu o Parlamento Nacional disciplinar os efeitos de medidas provisórias caducadas ou rejeitadas.

Daí a oportunidade para buscar a extinção de créditos tributários, inclusive, aqueles já objetos de execução fiscal.

Outrossim, encontra-se em tramitação o PL nº 462/2008 antes referido, que valida provisoriamente os CEBASs renovados automaticamente pela Medida Provisória nº 446/2008 até 31 de dezembro de 2009, ou até a data de julgamento de processos pendentes.

Esse projeto legislativo sob discussão no Congresso Nacional funda a eficácia de alguns de seus dispositivos nas normas da Medida Provisória nº 446/02008, pelo que esta deverá ser aprovada concomitantemente com o PL nº 462/2008, e não consumar a sua "devolução" ou rejeição, nem permitir sua caducidade.

Medidas legislativas elaboradas, a toque de caixa, ao sabor das paixões do momento sempre apresentam vícios e defeitos que comprometem o princípio da segurança jurídica.