MEIOS DE PROVA NO PROCESSO PREVIDENCIÁRIO
Tiago Faggioni Bachur - advogado militante nas áreas cível, comercial e previdenciária (formado pela Faculdade de Direito de Franca em 1998); professor de cursos jurídicos relacionados a área previdenciária na “Academia Francana de Direito – Instituto Rafael Infante Faleiros”; autor do livro “Teoria e Prática do Direito Previdenciário”, escrito em parceria com a Drª. Maria Lucia Aiello (Editora Lemos e Cruz); colaborador e articulista de várias revistas e informes jurídicos (como “Revista Consulex”, “Prática Jurídica”, “Jornal Trabalhista Consulex”, “Magister”, “Migalhas”, “IEPREV”, “LFG”, etc.); pós-graduando em Direito Previdenciário pela UNISAL; técnico em contabilidade (formado pelo SENAC/Franca); Membro da “Comissão Encarregada da Elaboração do Anteprojeto dos Novos Estatutos para a Fundação Civil Casa de Misericórdia de Franca”, representando o Sindicato dos Empregados Rurais de Franca e atuando como um dos redatores do anteprojeto (2002).
Fabrício Barcelos Vieira - advogado militante nas áreas cível, comercial e previdenciária (formado pela Faculdade de Direito de Franca); professor de cursos jurídicos relacionados a área previdenciária na “Academia Francana de Direito – Instituto Rafael Infante Faleiros”; membro do conselho editorial da segunda edição do livro “Teoria e Prática do Direito Previdenciário”, escrito pelo Dr. Tiago Faggioni Bachur em parceria com a Drª. Maria Lucia Aiello (Editora Lemos e Cruz); colaborador e articulista de várias revistas e informes jurídicos (como “Jornal Trabalhista Consulex”, “Magister”, “Migalhas”, “IEPEV”, LFG, etc.); pós-graduando em Direito Previdenciário pela UNISAL; pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade de Franca; MBA em Direito Empresarial pela FGV.
1. INTRODUÇÃO
O art. 332 da Lei Processual estabelece que “todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa.”
Deste modo, tratando-se de processo administrativo ou judicial previdenciário, a prova será devida pelo segurado apenas na hipótese de não existir informações do mesmo no CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais), ou quando o segurado entender que as informações constantes no cadastro não condizem com a realidade (art. 19, §3.º, do Decreto n. 3.048/99).
O presente estudo objetiva, então, de forma sucinta, demonstrar como tem sido feita a prova no processo administrativo e judicial previdenciário, principalmente no que diz respeito às quais são os meios de prova para comprovação do tempo de serviço.
2. DAS PROVAS
Necessário se faz, inicialmente, tecer considerações gerais sobre o tema prova.
O professor Moacyr Amaral Santo(Santos, Moacyr Amaral. Comentários ao Código de Processo Civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986, vol. IV, p. 3-4) estabelece que a prova é o conjunto de meios pelos quais se fornece ao juiz o conhecimento da verdade dos fatos deduzidos em juízo, sendo que sua finalidade é justamente a formação da convicção, no espírito do julgador, quanto à existência dos fatos da causa.
Por sua vez, Pontes de Miranda (Pontes de Miranda, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil, 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979, t. IV, p. 312) define prova como “o ato judicial, ou processual, pelo qual o juiz se faz certo a respeito do fato controverso ou do assento duvidoso que os litigantes trazem a juízo”.
E, sintetizando, Marco Aurélio Serau Júnior (Serau Junior, Marco Aurélio. Curso de processo judicial previdenciário. 2. ed. – São Paulo: Editora Método, 2006, p. 141) assim estabelece:
(...) prova judiciária é o meio de demonstração de fato pretérito ao magistrado. Não se pretende, com a instrução probatória, chegar-se à busca da verdade, mas apenas que se aplique a norma jurídica da forma como pretendida pela parte que declara o fato a ser comprovado.
No que diz respeito à apreciação das provas, nosso ordenamento jurídico pátrio estabeleceu o princípio da livre apreciação da prova, ora disciplinada pelo artigo 131 do Código de Processo Civil, que dispõe que “o juiz apreciará livremente a prova”.
Entretanto, em que pese a apreciação livre da prova, está o juiz condicionado ao respeito às condições impostas pela lei.
2.1. Do Início de Prova Material
A Súmula 149, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça estabelece que “a prova exclusivamente testemunhal não basta para comprovação da atividade rurícula, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. (g.n.)
Há que entenda, no entanto, que a referida Súmula especifica que a vedação de prova unicamente testemunhal é apenas para trabalhador rurícola.
Porém, o conteúdo da Súmula 27 do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, aponta que “não é admissível prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de exercício de atividade urbana e rural.” (g.n.)
Por sua vez, corroborando com o retro, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região já se decidiu que:
(...) a legislação especifica não admite prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de serviço, para fins previdenciários, exigindo, pelo menos, um início de prova material. (AC 2001.03.99.013371-2, 1ª Turma, Rel. Juiz Fed. Conv. Santoro Fachini, j. 24.06.2002, DJU 21.10.2002, p. 305).
Deste modo, como meio de prova para comprovação do tempo de serviço não se admite prova exclusivamente testemunhal, fazendo-se necessário, ao menos, um início de prova material.
Com efeito, o §3º do artigo 55 da Lei 8.213/91 assim dispõe:
Artigo55, §3º: A comprovação do tempo de serviço para efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art.108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento. (g.n.)
Sobre o tema, Bachur e Aiello destacam em seu livro:
“Para a comprovação do tempo de contribuição a ser contado, o contribuinte individual pode valer-se de documentos que comprovem o exercício de sua atividade, lembrando-se que os documentos do fato a se comprovar devem ser contemporâneos.
(...)
Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal para fins de comprovação de tempo de serviço. A prova unicamente testemunhal somente é admitida na ocorrência de casos fortuitos ou de força maior.
A prova testemunhal pode ser ainda utilizada em conjunto com indícios de demais provas documentais, (...).”(BACHUR, Tiago Faggioni/AIELLO, Maria Lucia – “Teoria e Prática do Direito Previdenciário” – 2ª edição revista, atualizada e ampliada. Ed. Lemos e Cruz. Pág. 395).
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA.AGRAVO RETIDO-TUTELA ANTECIPADA NA SENTENÇA - DESCABIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR URBANO. RECONHECIMENTO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE ATIVIDADE LABORATIVA DE BALCONISTA EXERCIDA EM EMPRESA FAMILIAR DE 12.09.1963 A 11.04.1972. NECESSIDADE DE INDENIZAÇÃO PELAS CONTRIBUIÇÕES NÃO PAGAS AO TEMPO EM QUE DEVIDAS. ARTIGO 96, IV, LEI Nº 8213/91. TEMPO LEGALMENTE EXIGIDO PARA APOSENTADORIA PROPORCIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO COMPROVADO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I - Remessa oficial tida por interposta, pois prolatada sentença contra os interesses de autarquia federal. II - Não é cabível o debate, nesta sede, a respeito da insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra a concessão da tutela antecipada no decisum, eis que, segundo orientação desta Turma, haveria o Instituto de requerer o recebimento de seu apelo, perante o Juízo de 1º grau, no efeito suspensivo, com a posterior interposição de agravo de instrumento, acaso tivesse seu pleito indeferido, para veicular seu inconformismo em relação a essa decisão interlocutória. III - A aposentadoria por tempo de serviço é devida ao segurado da Previdência Social que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se mulher, ou 30 (trinta) anos, se homem, evoluindo o valor do benefício de um patamar inicial de 70% do salário-de-benefício para o máximo de 100%, caso completados 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 35 (trinta e cinco) anos, se do sexo masculino. Aplicação do art. 202, II, CF, em sua redação original, anterior à edição da Emenda nº 20/98 e dos arts. 52 e seguintes da Lei nº 8.213/91. IV - A tais requisitos, soma-se a carência, em relação à qual estabeleceu-se regra de transição, posta pelo art. 142 da Lei nº 8.213/91, para o trabalhador urbano já inscrito na Previdência Social por ocasião da publicação do diploma legal em comento, a ser encerrada no ano de 2011, quando, somente então, serão exigidas as 180 (cento e oitenta) contribuições a que alude o art. 25, II, da mesma lei. V - Para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador não registrado, é exigido pelo menos um início razoável de prova documental, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, nos termos do § 3º do artigo 55 da Lei acima citada. VI - O período de 12.09.1963 a 11.04.1972, trabalhado sem registro em carteira, foi reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça. VII - A prova testemunhal, colhida sob o crivo do contraditório, ainda mais quando não contraditadas as testemunhas, tem valor relevante e integra o sistema probatório processual, permitindo ao juiz sopesar a sua valia e sobre ela assentar a sua convicção. VIII - Tendo o labor sido desenvolvido em empresa familiar, onde o autor agia como se proprietário fosse, deve ser aplicado ao caso o artigo 96, IV, da Lei nº 8.213/91. IX - Equiparado o autor à mesma condição do pai, ou seja, de titular de firma individual, à época da prestação do trabalho, e sendo segurado obrigatório da Previdência Social, conforme dispunha o artigo 5º, inciso III, da antiga LOPS (Lei nº 3.807, de 26/08/1960), estava obrigado ao recolhimento das contribuições previdenciárias devidas, nos termos do artigo 79 da mesma lei. X - O recolhimento das parcelas devidas a título de contribuição previdenciária deve obedecer as normas vigentes à época da prestação do trabalho, aplicando-se à hipótese aquela contida no artigo 144 do CTN. XI - De acordo com a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, neste período, referidas contribuições tinham caráter tributário. Somente a partir da Emenda 08/77, até a Carta Magna de 1988 entrar em vigor, é que passaram a ter outro perfil. XII - Na CTPS do autor constam registrados alguns contratos de trabalho, cuja soma perfaz 23 (vinte e três) anos, 6 (seis) meses e 11 (onze) dias. XIII - Com relação à veracidade das informações constantes da CTPS, esta Corte firmou entendimento no sentido de que gozam da presunção de veracidade juris tantum. As anotações nela contidas prevalecem até prova inequívoca em contrário, nos termos do Enunciado nº 12 do TST. XIV - Somados os tempos anotados na Carteira de Trabalho e aquele reconhecido pelo STJ, o autor conta com o total de 32 (trinta e dois) anos, 1 (um) mês e 11 (onze) dias, o que permite a concessão de aposentadoria proporcional por tempo de serviço, conforme dispõe o art. 53 da Lei 8.213/91. XV - A correção monetária das parcelas vencidas incide na forma da súmula nº 08 deste Tribunal, e 148 do STJ, bem como da Lei 6.899/81 e legislação superveniente. XVI - Os juros moratórios são computados desde a citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até o dia anterior ao da vigência do novo Código Civil e, após, de 1% (um por cento) ao mês. XVII - Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, entendida como a soma das parcelas vencidas até a prolação da decisão concessiva do benefício, no caso a sentença do juízo a quo, não cabendo sobre as prestações vincendas, a teor da súmula 111 do STJ. XVIII - O INSS é isento de custas, mas deve reembolsar as despesas efetivamente comprovadas. XIX - Agravo retido não conhecido. Remessa oficial, tida por interposta, e apelação do INSS parcialmente providas. Tutela antecipada mantida.( Origem: TRFda 3ªRegião.Classe : AC - APELAÇÃO CÍVEL – 413486.Processo: 98.03.024595-3.UF: SP.Órgão Julgador: NONA TURMA.Data do Julgamento:12/05/2008.Fonte: DJF3 DATA:25/06/2008. Rel.JUIZ HONG KOU HEN)(grifos nossos)
Entretanto, segundo acima demonstrado, o início de prova material, no caso de comprovação do tempo de contribuição, é dispensado quando houver ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito.
Os mestres Castro e Lazari (Castro, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário / Carlos Alberto Pereira de Castro; João Batista Lazzari – 9. ed. Florianópolis:Conceito Editorial, 2008. p. 625) dão exemplo para comprovação do motivo de força maior ou caso fortuito:
O motivo de força maior ou caso fortuito deverá ser comprovado por meio de certidão do corpo de bombeiro, Defesa Civil, Boletim de Ocorrência Policial, conforme o caso. Da ocorrência policial deverão constar registros que evidenciem que a empresa foi atingida pelo sinistro (endereço, os setores atingidos, documentação destruída, danos causados, etc.).
Retomando o tema início de prova material, denota-se ainda que tais documentos devem ser contemporâneos dos fatos a comprovar, nos termos do artigo 62 do Decreto 3.048/99:
Art. 62. A prova de tempo de serviço, considerado tempo de contribuição na forma do art. 60, observado o disposto no art. 19 e, no que couber, as peculiaridades do segurado de que tratam as alíneas "j" e "l" do inciso V do caput do art. 9º e do art. 11, é feita mediante documentos que comprovem o exercício de atividade nos períodos a serem contados, devendo esses documentos ser contemporâneos dos fatos a comprovar e mencionar as datas de início e término e, quando se tratar de trabalhador avulso, a duração do trabalho e a condição em que foi prestado.
Quanto a não admissão de prova exclusivamente testemunhal em processo previdenciário, devem ser tecidos alguns destaques, principalmente no que diz respeito a alguns entendimentos sobre sua ilegalidade e inconstitucionalidade.
Pois bem, a prova testemunhal, em nosso sistema processual civil, é regida pelo disposto nos artigos 400 a 419 do Código de Processo Civil, aplicando-se tais regras gerais a todos os ramos do processo, inclusive o processo previdenciário, seja administrativo ou judicial.
Amaral Santos (Santos, apud, p. 244), tratando do tema supra, pronuncia-se indicando que: “(...) as limitações ao uso da prova testemunhal não atingem senão as convenções excedentes de certo valor e mais algumas hipóteses expressamente previstas em lei”.
Com efeito, Saraiva (Saraiva, Renato. Curso de direito processual do trabalho. São Paulo: Método, 2005. p. 349) dicciona que “não se pode negar que, no âmbito laboral, a prova testemunhal ainda é o meio de prova mais utilizado, constituindo-se, muitas vezes, no único meio de prova da parte”.
Por seu turno, os nossos tribunais já têm reconhecido a possibilidade da prova exclusivamente testemunhal para comprovação de tempo de serviço, para fins previdenciários:
“A exigência de prova escrita, com relação aos rurícolas, deve ser abrandada, sobretudo quando a alegação da parte vem respaldada por depoimentos coerentes, firmados por pessoas idôneas, e o réu, presente a todos os atos, não refutou a prova apresentada” (TRF 3ª Região, 2ª Turma, Rel. Des. Fed. Célio Benevides, j. 03.06.1997, DJ 25.06.19997, p. 48.227).
No mesmo sentido, fundamentando-se na prerrogativa da livre convicção ou da livre apreciação da prova, edificou o TRF da 3ª Região:
“Os depoimentos testemunhais, que revelam o período trabalhado pelo autor na condição de rurícola, permitem que o julgador, aplicando o princípio da livre convicção, forme seu juízo quanto ao cabimento do direito pleiteado, sendo dispensável para tanto o início de prova material” (TRF 3ª Região, AC 95.03.014921-5, 5ª Turma, Rela. Desa. Fed. Suzana Camargo, j. 24.02.1997, DJ 22.07.19997, p. 55.908).
A Constituição Federal estabelece em seu artigo 5º, inciso LVI a admissão de quaisquer provas, desde que não obtidas por meios ilícitos. Assim, a prova testemunhal não pode ter sua eficácia limitada por não vir acompanhada de início de prova documental, sob pena de cercear-se o poder do juiz. Isto é o que já consolidou nossos tribunais:
“O princípio do devido processo legal pressupõe um juiz imparcial e independente, que haure sua convicção dos elementos de prova produzidos no curso do processo. O artigo 5º, inc. LVI, da CF admite quaisquer provas, desde que não obtidas por meios ilícitos. Assim, a prova testemunhal não pode ter sua eficácia limitada por não vir acompanhada de início da documental, sob pena de cercear-se o poder do juiz, relativamente à busca da verdade e sua convicção quanto a ela” (TRF 3ª Região, AC 2000.03.99.046646-5, 5ª Turma, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, j. 15.10.2002, DJU 10.12.2002, p. 467).
O não acolhimento da um sistema de valoração legal das provas é a lição de Gonçalves Correia (Correia, Marcus Orione Gonçalves. Curso de direito da seguridade social. São Paulo: Saraiva. 2001, p. 260):
(...) há que vingar o princípio do livre conhecimento motivado, sendo que não há acolhida um sistema de valoração legal das provas. Portanto, se ao juiz satisfizerem, pela sua coerência e credibilidade, os depoimentos testemunhais, não há como compeli-lo a não acolher o pedido unicamente com base nessa prova (...).
Fazendo-se uma análise sob uma ótica meramente processual, admite-se a prova unicamente testemunhal pelo fato de que “a hierarquização da prova material sobre testemunhal não tem ressonância em nosso ordenamento jurídico, consoante o art. 332 do CPC”( TRF da 3ª Região, AC 94.03.026546-9, 1ª Turma, Rel. Des. Fed. Peixoto Jr., j. 13.09.1994, DJ 28.03.1995, P. 16.509).
Sob a ótica do processo previdenciário, em que se condensam direito fundamentais qualificados como sociais, Marco Aurélio Serau Junior leciona:
Notadamente na esfera judicial previdenciária, em que se lida com a concessão de prestações e benefícios previdenciários, que condensam direitos fundamentais qualificados como sociais, a utilização daquela modalidade de prova testemunhal merece guarida pelo fato de que fortalece os próprios direitos fundamentais.
O Egrégio Superior Tribunal de Justiça já se manifestou cristalinamente sobre a inconstitucionalidade do artigo 55, § 1º da Lei 8.213/1991, senão vejamos:
Evidente a inconstitucionalidade da Lei 8.213/91 (art. 55, § 1º) que veda, para a comprovação de tempo de serviço, a prova exclusivamente testemunhal. A restrição afeta a busca do Direito Justo (REsp 1998.00.41435-5, Rel. Min. Juiz Vicente Cernicchiaro, j. 22.09.1998, DJ 26.10.1998, P. 182.)
O artigo 19 do Decreto 3.048/99 dispõe que:
Art.19. A anotação na Carteira Profissional ou na Carteira de Trabalho e Previdência Social e, a partir de 1º de julho de 1994, os dados constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS valem para todos os efeitos como prova de filiação à Previdência Social, relação de emprego, tempo de serviço ou de contribuição e salários-de-contribuição e, quando for o caso, relação de emprego, podendo, em caso de dúvida, ser exigida pelo Instituto Nacional do Seguro Social a apresentação dos documentos que serviram de base à anotação.
Há de se apontar que os segurados empregados comprovam seu tempo de serviço/contribuição com a apresentação da CTPS onde estejam anotados seus contratos de trabalho (conforme artigo 62, § 2°, I do Decreto 3.048/99). Não precisam comprovar o recolhimento das contribuições, porque essa obrigação é do empregador. Senão vejamos:
“(...) Cuidando-se de segurado empregado, a obrigação pelo recolhimento das contribuições é do empregador, a teor do que dispõem a Lei 3.087/60 (art. 79,I) e a vigente Lei 8.212/91 (art. 30, I, “a”), não se podendo imputá-la ao empregado (...)” (TRF 1ª Região, AC 350002006618/GO, Rel. Des. Fed. Luiz Gonzaga Barbosa Moreira, DJ 14-6-2004, p. 4).
Há de se apontar que os segurados empregados comprovam seu tempo de serviço/contribuição com a apresentação da CTPS onde estejam anotados seus contratos de trabalho (conforme artigo 62, § 2°, I do Decreto 3.048/99). Não precisam comprovar o recolhimento das contribuições, porque essa obrigação é do empregador. Senão vejamos:
“(...) Cuidando-se de segurado empregado, a obrigação pelo recolhimento das contribuições é do empregador, a teor do que dispõem a Lei 3.087/60 (art. 79,I) e a vigente Lei 8.212/91 (art. 30, I, “a”), não se podendo imputá-la ao empregado (...)” (TRF 1ª Região, AC 350002006618/GO, Rel. Des. Fed. Luiz Gonzaga Barbosa Moreira, DJ 14-6-2004, p. 4).
Deixando de lado os questionamentos supra, e levando-se em conta o entendimento do INSS, nos termos da Instrução Normativa INSS/PRES Nº 20/2007, artigo 372 e seguintes, deve-se proceder a instauração da Justificação Administrativa para comprovação do exercício de atividade laboral nos períodos a ser discutidos, que não foram anotados na CTPS da requerente.
2.2. Da Justificação Administrativa
A Lei 8.213/91, em seu art. 108 aponta que, para fins de comprovação de tempo de serviço/contribuição, poderá ser suprida a falta de documento mediante justificação processada perante a Previdência Social. Observemos:
Art. 108. Mediante justificação processada perante a Previdência Social, observado o disposto no § 3º do art. 55 e na forma estabelecida no Regulamento, poderá ser suprida a falta de documento ou provado ato do interesse de beneficiário ou empresa, salvo no que se refere a registro público.
Por sua vez o Decreto 3.048/99 (arts. 142 a 151) e a Instrução Normativa INSS/PRES n° 20/2007 (arts. 372 a 389) regulamentam as disposições sobre a Justificação Administrativa – JA.
A Justificação Administrativa (ou comumente chamada de JA) é o meio utilizado para suprir a falta ou insuficiência de documentos ou produzir prova de fato ou circunstância de interesse dos beneficiários perante a Previdência Social.
Deve-se ter em mente que o processamento da Justificação Administrativa só será admitido na hipótese de ficar evidenciada a inexistência de outro meio capaz de configurar a verdade do fato alegado.
Conforme lição dos professores Castro e Lazzari (Castro, apud,. p. 624-625) trata-se da Justificação Administrativa de “um meio de prova de natureza administrativa, processada perante a própria Previdência Social. Esta vai avaliar a prova produzida para verificar sua autenticidade.”
Por sua vez, Osíris A. Borges de Medeiros (Medeiros, Osíris A. Borges de. Aposentadoria ao alcance de todos. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 131) define a Justificação Administrativa como “o procedimento utilizado para provar fatos ou circunstâncias de interesse dos beneficiários frente à Previdência Social e que eles não conseguem deixar completamente demonstrados apenas com documentos”.
Interessante mencionar que a JA, nos termos do artigo 142, § 2° do Decreto 3.048/99 e art. 372 da referida IN, não poderá ser processada isoladamente como processo autônomo, devendo ser decorrente de processo de benefício, de averbação de tempo de serviço ou de Certidão de Tempo de Contribuição – CTC.
Ademais, a Justificação Administrativa não será admitida quando o fato a comprovar exigir registro público de casamento, de idade ou de óbito, ou de qualquer ato jurídico para o qual a lei prescreva forma especial.
Já o artigo 374 dicciona que a prova do exercício do labor dever ser feita por documento contemporâneo. E, para o segurado empregado que pretender comprovar exercício de atividade, a documentação deve propiciar a convicção quanto ao alegado, constando a designação da atividade, bem como a empresa em que deseja demonstrar ter trabalhado. Algo que a requerente cumpriu a contento. Vejamos:
Art. 374. A prova de exercício de atividade poderá ser feita por documento contemporâneo que configure a verdade do fato alegado ou que possa levar à convicção do que se pretende comprovar, observando-se o seguinte:
I – se o segurado pretender comprovar o exercício de atividade na condição de empregado, a documentação apresentada deverá propiciar a convicção quanto ao alegado, constando a designação da atividade, bem como a da empresa em que deseja demonstrar ter trabalhado;
II – a JA deve ser processada mediante a apresentação de início de prova material, devendo ser demonstrado um ou mais indícios como marco inicial e outro como marco final, bem como, se for o caso, outro para o período intermediário, a fim de comprovar a continuidade do exercício da atividade;
III – a aceitação de um único documento está restrita à prova do ano a que ele se referir.
Contudo, na falta de documento contemporâneo podem ser aceitos declaração do empregador ou seu preposto, atestado de empresa ainda existente, certificado ou certidão de entidade oficial dos quais constem os dados previstos no caput do artigo 62, desde que extraídos de registros efetivamente existentes e acessíveis à fiscalização do Instituto Nacional do Seguro Social. (§3.º do artigo 62 do Decreto 3.048/99).
Ainda, em cumprimento ao disposto no artigo 143, § 3ª do Decreto 3.048/99 e art. 375 da IN 20/07, deve-se juntar prova oficial da existência da empresa do período em que se pretende comprovar o exercício de atividade laboral da requerente, atendendo-se, assim, permissivo do art. 375, § único da IN 20/07 que dispõe:
Art. 375. Para fins de comprovação de tempo de contribuição por processamento de JA, para empresa em atividade ou não, deverá o interessado juntar prova oficial de existência da empresa, no período que se pretende comprovar.
Parágrafo único. Servem como provas de existência da empresa, as certidões expedidas por Prefeitura, por Secretaria de Fazenda, por Junta Comercial, por Cartório de Registro Especial ou por Cartório de Registro Civil, nas quais constem nome, endereço e razão social do empregador e data de encerramento, de transferência ou de falência da empresa.
Na justificação administrativa, admite-se a indicação de testemunhas, em número não inferior a três e nem superior a seis. A restrição qualitativa destas é a mesma prevista no artigo 142 do Código Civil, exceto pelos cônjuges.
Ademais, aponta-se que as testemunhas arroladas devem ser, de preferência, colegas de trabalho da época em que o beneficiário exerceu a atividade que busca comprovar, em perfeita consonância com o que reza os artigos 378 e 379 da IN 20/07, assim como artigo 146 do Decreto 3.048/99.
Desta forma a inquirição das testemunhas deve ser nos termos do disposto nos artigos 382 da IN 20/97 e 145 do Decreto 3.048/99.
Quando o início de prova material necessitar de parecer grafoténico, somente será aceito ser realizado por perito técnico especializado em perícia grafotécnica e inscrito no órgão competente, devendo também ser apresentado os documentos originais que serviram de base para realização do exame. É o que determina o artigo 377 da IN 20/97:
Art. 377. Quando do requerimento de JA, o laudo de exame documentoscópico com parecer grafotécnico, se apresentado como início de prova material, somente será aceito se realizado por perito especializado em perícia grafotécnica e se ele for inscrito no órgão competente e se, concomitantemente, forem apresentados os documentos originais que serviram de base para a realização do exame.
E, ao fim, deve o INSS proceder a homologação da Justificação Administrativa (nos termos do artigo 385 e §s da IN 20/07) mencionando o responsável pela análise sobre sua impressão a respeito da idoneidade das testemunhas e opinando conclusivamente sobre a prova produzida, de forma a confirmar os fatos alegados, lembrando que não é de sua competência analisar o início de prova material apresentado.
Há de se mencionar que, nos termos do artigo 147 do Decreto 3.048/99, não caberá recurso da decisão da autoridade competente do INSS que considerar eficaz ou ineficaz a justificação administrativa.
2.3. Da Justificação Judicial
A Justificação também poderá ser Judicial, cuja jurisdição é voluntária. Seu procedimento é o previsto no Livro de Processo Cautelar (Código de Processo Civil), nos artigos 861 a 866, consistente na simples inquirição de testemunhas, sem caráter contencioso, admitindo-se apenas a contradita das testemunhas e a manifestação sobre os documentos eventualmente acostados.
A decisão (consubstanciada na sentença) apenas homologa a prova produzida, não adentrando o mérito de sua validade, assim, não há condenação do INSS a reconhecer o tempo de serviço.
Retomando-se a questão da não admissão da prova exclusivamente testemunhal, necessitando-se início de prova material, o mestre Marcelo Leonardo Tavares (Tavares, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário – 10. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, p. 189) entende que, no caso da justificação judicial, o dispositivo referido não ofende o princípio da livre apreciação das provas no processo civil:
No caso da justificação judicial, o dispositivo referido não ofende o princípio da livre apreciação das provas no processo civil. Não se trata de impor limites ao processo judicial ou de criar condição específica para o legítimo exercício do direito de ação. O Magistrado será livre para permitir a produção de provas. No entanto, para que seja esta homologada no INSS, ou terá que vir com a apresentação do início de prova material nos próprios autos, ou, tendo por base prova exclusivamente testemunhal, o início de prova material deve complementá-la, quando da apresentação da justificação ao INSS.
Por outro lado, corroborando com o já mencionado no presente estudo, o Auditor-Fiscal e professor Ivan Kertzman (Kertzman, Ivan. Curso prático de direito previdenciário – 5. ed. Salvador: Editora JusPodivm, p. 274), preceitua que seria descabido que a administração pública desconsidere uma decisão judicial processada com base em prova exclusivamente testemunhal:
Por outro lado, parece-nos descabido que a administração pública tente desconsiderar o conteúdo de uma decisão judicial, não a reconhecendo para fins de concessão de benefícios previdenciários.
Os professores Castro e Lazari (Castro, apud,. p. 626) apontam que a Justificação Judicial vem encontrando experiência exitosa em alguns Juizados Especiais Federais para comprovação de tempo rural, senão vejamos:
Experiência exitosa tem sido adotada em alguns JEFs, em que o INSS é intimado, antes da citação ou após a contestação, para que se efetue justificação administrativa para oitiva das testemunhas voltadas à comprovação do exercício da atividade rural. Tal prática tem dispensado a realização de audiências de instrução e proporcionando a realização de acordos nas ações que buscam a comprovação do tempo rural para concessão de benefícios.
3. DA AÇÃO DECLARATÓRIA
Nosso ordenamento jurídico já firmou o entendimento que o instrumento processual adequado para resolver incerteza sobre existência de uma relação jurídica, tal como o reconhecimento de tempo de serviço/contribuição, é a ação declaratória.
É o que os já festejados Castro e Lazari (Castro, apud. p. 626) preceituam:
Depois de alguma divergência inicial a jurisprudência firmou o entendimento de que, a ação declaratória é a via processual adequada para o reconhecimento de tempo de serviço/contribuição, uma vez que o fim visado é justamente a declaração de uma relação jurídica que precisa ser aclarada, sendo inegável a necessidade da tutela jurisdicional para a satisfação da pretensão de direito material.
No mesmo sentido, nossos tribunais já edificaram o seguinte entendimento:
“Processual Civil. Previdenciário. Tempo de Serviço para fins Previdenciários. Comprovação. Ação Declaratória. Instrumento Idôneo. A Ação Declaratória, segundo o comando expresso no art. 4° do Código de Processo Civil, é instrumento processual adequado para resolver incerteza sobre a existência de uma relação jurídica, sendo patente o interesse de agir do segurado da Previdência Social que postula, por essa via processual, o reconhecimento do tempo de serviço para efeito de percepção do benefício. Recurso Especial conhecido e provido. Embargos de Divergência não acolhidos”(ED em REsp n. 97.314/RS, STJ, 3ª Seção, rel. Min. Vicente Leal, DJU de 3.11.97, p. 56.217).
Baseado no entendimento supra o Ministério da Previdência e Assistência Social editou a Portaria 5.409/99, que dispensa o INSS de interpor Recurso Especial ao Superior Tribunal de Justiça nas causas judiciais quando a questão versada no acórdão do Tribunal de segunda instância tratar exclusivamente do cabimento de ação declaratória para reconhecimento de trabalho rural. Além disso, quando versar outra matéria, o INSS fica autorizado a não interpor recurso especial contra a parte da decisão que julga cabível a ação declaratória para reconhecimento de tempo de trabalho rural.
E mais, corroborando que o retro discorrido, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça sumulou a matéria em novembro de 2000, editando a Súmula n° 242, nos seguintes termos:
Súmula n. 242 – Cabe ação declaratória para reconhecimento de tempo de serviço para fins previdenciários.
4. CONCLUSÃO
Em resumo, a Previdência Social representa o resguardo daqueles que necessitam da proteção social. No entanto, para a obtenção do benefício previdenciário, a legislação específica (Lei 8.213/91) exige certos documentos comprobatórios do preenchimento dos requisitos para a obtenção do benefício previdenciário. A falta de qualquer deles acarreta indeferimento do benefício no âmbito administrativo, tendo o segurado a possibilidade de requerê-lo, ainda, judicialmente.
O que se pretende, em verdade, é que sejam legalmente exigidas apenas provas de fácil obtenção pelo segurado e que realmente tragam elemento substancial ao requerimento do benefício, seja administrativo, seja judicial.
A exigência do início de prova material, afastando-se provas exclusivamente testemunhais, fere princípios basilares da nossa Constituição Federal.
Deste modo, a Previdência Social somente garantirá o benefício necessário ao segurado acometido de um risco social (invalidez, doença, idade avançada etc.), risco esse futuro e incerto, quando deixar de lado os formalismos e a burocracia desnecessários, e buscar realmente um processo justo e que respeite plenamente objetivo de garantir a proteção social.
5. BIBLIOGRAFIA
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