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A Aposentadoria Rural

A APOSENTADORIA RURAL

Gleiser Lúcio Boroni Soares – Especialista em direito Previdenciário

 


 

1 INTRODUÇÃO

 

1.1 Breve Histórico

 

A vida no campo nunca foi fácil. No passado a densidade demográfica na zona rural era maior que nos meios urbanos. As terras pertenciam a grandes fazendeiros que possuíam vários colonos, ou melhor, posseiros que moravam e trabalhavam com suas respectivas famílias na pecuária e na agricultura.

 

Com os avanços tecnológicos, principalmente a partir da década de 1960, os grandes latifundiários foram substituindo a mão de obra braçal por equipamentos mecanizados. As juntas de bois que aravam as terras foram substituídas por grandes tratores.

 

No lugar das indenizações trabalhistas, os lavradores recebiam pequenas glebas de terras que passavam a ser cultivas em regime de economia familiar.

 

Como os pedaços de terras cultivados pelas famílias de agricultores eram insuficiente para que as famílias tirassem seu sustento, na maioria das vezes, os filhos dos lavradores buscavam trabalho na zona urbanas, para onde migravam-se sem ter uma moradia e, normalmente, iam morar em favelas e outros lugares sem saneamento básico.

 

Com o êxodo rural, a violência urbana vem aumento assustadoramente no Brasil ao longo das últimas décadas.

 

1.2 Evolução da Aposentadoria Rural no Brasil

 

A partir da Lei Eloi Chaves em 1923, foi regulamentado a criação das Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAP) dos trabalhadoresurbanos, para que se inaugurasse no Brasil um sistema de assistência social aos idosos e inválidos da zona rural.

 

Somente com a Lei Complementar nº 11, de 1971, foi implementado a partir de 1972 o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural / Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural (Prorural / Funrural), que assistia os trabalhadores rurais, pescadores (a partir de 1972) e garimpeiros (a partir de 1975), oferecendo benefícios precários de aposentadoria por idade aos 65 anos, limitados ao arrimo de família e tendo meio salário mínimo como teto.

 

Com o advento da Constituição de 1988 implantou-se o regime de universalização de atendimento aos idosos e inválidos do meio rural.
A partir daí, introduziu-se o princípio do acesso universal de idosos e inválidos de ambos os sexos à previdência social, em determinado regime
especial, cuja principal característica é incluir o chamado setor rural informal, constituído pelo “produtor, parceiro, meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro e o pescador artesanal, bem como respectivos cônjuges que exerçam suas atividades em regime de economia familiar sem empregados permanentes” (art. 194, § 8º , Constituição Federal de 1988). Esse público informal, do chamado regime de economia familiar, ao qual se soma o pequeno setor formal, composto por trabalhadores com carteira assinada, contribuintes em folha de pagamento à previdência social, era precariamente atendido pelo regime assistencial anterior, o Funrural, inaugurado pelo Regime Militar em 1971.

 

As principais mudanças normativas ocorridas a partir da Constituição de 1988, e que tiveram efetiva aplicação administrativa a partir de 1992, foram as seguintes:

 

·        equiparação de condições de acesso para homens e mulheres (o antigo regime era específico para o“cabeça” do casal);

·        redução do limite de idade para aposentadoria por idade (60 anos para
homens e 55 para mulheres);

·        estabelecimento de um piso de aposentadorias e pensões em
um salário mínimo (o regime anterior estabelecia teto em meio salário mínimo para o público do Funrural e pensões limitadas a 30% do benefício principal

 

Essas medidas segundo Beltrão (2000) aumentaram expressivamente em poucos anos (1992/1995) o grau de cobertura do sistema sobre o conjunto dos domicílios rurais e elevaram substancialmente a participação da renda previdenciária na renda familiar rural.

 

A renda disponibilizada pelos trabalhadores rurais é muitas vezes a única fonte de renda da família, já que na zona rural, a prática da agricultura familiar não garante renda correntemente monetária a família, devido à fatores de localização, heterogeneidade dos produtos, oferta irregular, e, considerando ainda que a comunidade se localiza por vezes distante dos centro de comercialização. Outro fator que acaba precarizando a formação da renda é a baixa produtividade, graças ao pouco incremento de capital, insumos e a própria característica das terras disponíveis, diante esses fatores a renda gerada pela aposentadoria ganha cada vez mais importância na dinâmica econômica rural.

 

Assim a participação do idoso na revitalização da renda familiar rural é um fenômeno que vem ganhando grande relevância e que, portanto, merece melhores observações e questionamentos. A recente universalização do acesso do trabalhador rural aos benefícios previdenciários gerou um aumento da demanda efetiva o que permite a fixação de parte dessa população residente no campo, mas não é o suficiente para tal.

 

O novo texto constitucional equiparou, para fins previdenciários, os trabalhadores rurais aos urbanos, garantindo aos primeiros os mesmos benefícios securitários repassados aos trabalhadores urbanos.

 

O constituinte originário de 1988, no entanto, foi além. Ao reconhecer a situação de hipossuficiência do trabalhador rural – gerada, por vezes, pela penúria do 
trabalho no campo – optou por criar uma norma constitucional de exceção àqueles que retiram do campo sua fonte de sustento,  chamado regime de subsistência.


Foi criada, assim, a figura do segurado especial. A par do segurado obrigatório e do facultativo, o segurado especial é uma espécie do gênero segurado, só que com fundamento de validade constitucional. Tal segurado especial deve contribuir para o sistema previdenciário. Não se trata de benefício assistencial, mas de benefício previdenciário. Foi apenas ?exibilizada a forma de contribuição. A figura do segurado especial encontra assento no art. 195, § 8º, da CR/88.

 

O produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais e o pescador 
artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, contribuirão para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos termos da lei.

 

A proteção ao homem do campo após a Constituição de 1988 não ficou limitada à figura do segurado especial constitucional. O legislador ordinário, ao regulamentar 
o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e fixar os requisitos para os benefícios previdenciários, criou outra exceção direcionada aos homens do campo. Estabeleceu no art. 143 da Lei nº 8.213/91 uma aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais, no valor de um salário mínimo, sem que houvesse a contraprestação típica do sistema previdenciário.

 

O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no regime geral de previdência social, na forma da alínea “a” do inciso I (trabalhador rural), ou do inciso IV (revogado) ou VII (segurado especial) do art. 11 desta lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, contados a partir da data de vigência desta lei, desde que comprove o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.

 

Para a hipótese de incidência do benefício do art. 143, aos trabalhadores 
rurais, exige-se: idade para se aposentar; prova da atividade rural; carência; exercício 
imediatamente anterior ao requerimento; e requerimento em até 15 anos, a contar da 
edição da Lei nº 8.213/91. Por sua vez, no que tange aos segurados especiais, além dos requisitos acima, há mais um: exercício da atividade rural em regime de economia familiar sem empregados permanentes.

 

A aposentadoria rural representa um autêntico programa de renda mínima para os idosos residentes na área rural, gerando um grande impacto econômico, principalmente nos municípios mais pobres das regiões menos desenvolvidas.

 

2 REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR IDADE

 

2.1 Idade

 

O primeiro requisito para a análise do direito ao benefício da aposentadoria  rural por idade, previsto no art. 143 da Lei nº 8.213/91 é a necessidade de constatação 
da idade do requerente, que nos termos do art. 201, § 7º, II da CR/88 é de 60 anos para homens e 55 para mulheres.

 

A constatação da idade, na maior parte dos casos, é efetivada sem maiores dificuldades, porém não podemos nos afastar de tristes realidades do nosso país: há pessoas que não têm prova da data de seu nascimento.

 

2.1.1 Cômputo do trabalho do menor de idade

 

A atividade no campo, na maioria dos casos, tem início desde a infância. Nos termos do art. 7º, XXXIII, da CR/88 o menor só poderá trabalhar a partir dos 
16 anos ou a partir dos 14 na qualidade de aprendiz.

 

Inicialmente entendia só ser possível reconhecer a atividade no campo a partir dos 16 anos, mas antes da CR/88, encontrava-se em vigor o art. 165, X, da CR/67 
(repetido na CR/69), que previa a idade mínima de 12 anos para o trabalho do menor. 

 

Assim, esta deve ser a idade mínima para cálculo do exercício do trabalho rural para aqueles (as) que na vigência dos antigos diplomas começaram a exercer suas atividades rurais.

 

2.2 Carência

 

O art. 143 da Lei nº 8.213/91 prevê que a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade deverá observar a carência do benefício da aposentadoria geral por idade, previsto no art. 25, II da Lei nº 8.213/91: 180 contribuições mensais. Nos termos do art. 142 da Lei nº 8.213/91, para os segurados já inscritos no RGPS antes da edição da lei em tela (24/7/1991), a carência de 180 contribuições é diferida em uma tabela progressiva em relação à data na qual o segurado tenha alcançado a idade necessária para se aposentar. Quanto aos trabalhadores rurais, estes poderão se aposentar como tal, sem contribuições, mas deverão comprovar 15 anos de trabalho no campo, nos termos do art. 25, II, c/c art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91.

 

A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício, conforme tabela progressiva do artigo 142 da Lei 8.213/91.

 

2.3 Comprovação de atividade rural imediatamente anterior ao requerimento

 

Uma análise do requisito constante no art. 143 da Lei nº 8.213/91 no sentido de que o exercício da atividade rural seja imediatamente anterior ao requerimento do benefício, pode levara conclusões inadequadas. O entendimento jurisprudencial fundamenta-se no fato de que os requisitos para a concessão de aposentadorias devem ser verificados por ocasião do preenchimento das condições.

 

Assim ao completar a idade mínima, 60 se homem e 55 se mulher, deve-se verificar, se o(a) segurado(a) estava ou não exercendo atividade rural, mesmo que venha a efetivar o requerimento posteriormente.

 

O que o legislador pretendeu evitar que o segurado, que tenha deixado o trabalho no campo há tempo razoável, tente se aposentar por já ter cumprido a carência de 15 anos. Ou seja, se tenta evitar que o trabalhador rural que tenha saído do campo perceba de modo indevido esse benefício, que na verdade é uma forma de compensação pelas falhas do sistema anterior, como já demonstrei.

 

Assim, quando o segurado completar a idade necessária, ou posteriormente, deverá estar trabalhando no campo pelo período de carência (15 anos).

 

É importante ressaltar que o trabalho no campo poderá ser descontínuo, de tal forma que, se um trabalhador rural venha a exercer alguma atividade urbana e volte a trabalhar no campo, não deixará de fazer jus a esse benefício. Nesse sentido: STJ, 3ª Seção, EResp nº 329.269/RS, DJ de 28/8/2002 e Enunciado nº 5 da Súmula de Jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais: “A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei nº 8.213/91, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovado, pode ser reconhecida para fins previdenciários”.

 

2.3.1 Da prova da atividade rural

 

O art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91 prevê que, para se provar o tempo de serviço visando à concessão de aposentadoria, deve haver início de prova material.

 

O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca a lista dos documentos considerados hábeis à comprovação da atividade rural, quais sejam:

 

I– contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social; Incluído pela LEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural; Incluído pela LEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

III – declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou, quando for o caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS; Incluído pelaLEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

IV – comprovante de cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar; 

V – bloco de notas do produtor rural; Incluído pela LEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7o do art. 30 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor; V

VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante; Incluído pela LEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da produção; Incluído pela LEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural; ou Incluído pela LEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra. Incluído pela LEI Nº 11.718 - DE 20 JUNHO DE 2008 – DOU DE 23/6/2008

 

A jurisprudência tem sido bastante ?exível, admitindo uma variedade elevada de documentos, como por exemplo:

 

·        registros civis que indicam que o requerente era trabalhador rural;

·        registros civis que demonstram que o seu cônjuge trabalhava no campo;

·        declaração de ex-empregador;

·        notificação para lançamento de ITR mesmo em nome do pai;

·        certidão da justiça eleitoral;

·        prova de associação contemporânea à sindicato rural (carteira ou guia de pagamento);

·        certidão do RGI ou do Incra, mesmo em nome do pai;

·        fichas escolares dos filhos em área rural;

·        escritura de compra de imóvel rural.

 

 

2.3.2 Da prova testemunhal

 

 

Segundo os enunciados abaixo a prova unicamente testemunhal é insuficiente para comprovar a atividade rural, senão vejamos:

 

Enunciado nº 149 da Súmula de Jurisprudência do STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação de atividade rurícola, para fins da obtenção do benefício previdenciário”.

 

Enunciado nº 14 da Súmula de Jurisprudência da TNU: “Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício” 

 

Enunciado nº 34: “ Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar”.

 

3 RURÍCOLAS PODEM REQUERER APOSENTADORIA ATÉ 31/12/2010

 

Câmara aprova nova regra para aposentadoria rural

 

            Com a aprovação da Medida Provisória nº 385/07, o trabalhador rural tem prorrogação no prazo para requerer a aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo.

 

O texto original dispunha que só os trabalhadores rurais autônomos podiam requerer aposentadoria até 25 de julho de 2008. Com a aprovação da MP, todos os trabalhadores rurais – autônomos ou não – têm até o dia 31 de dezembro de 2010 para comprovar o tempo de trabalho necessário à aposentadoria.

 

A matéria aprovada na forma do projeto de lei de conversão estendeu até 31 de dezembro de 2010 o prazo para todos os trabalhadores rurais conseguirem comprovar o tempo de trabalho necessário à aposentadoria.

 

A aposentadoria rural por idade no valor de um salário mínimo precisa da comprovação de exercício da atividade por 180 meses. Como o governo considera insuficiente a nova data final (dezembro de 2010) para a mudança de comportamento dos empregadores quanto à formalização das relações de trabalho, o projeto de lei de conversão adota um mecanismo de contagem especial do tempo de serviço.

 

Cada mês comprovado de trabalho no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2015 será contado em triplo dentro de cada ano. Já no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, a contagem será em dobro. Ambas serão limitadas a doze meses dentro de cada ano. Se, por exemplo, um trabalhador rural conseguir comprovar três meses em cada ano no primeiro período, ele terá 45 meses na contagem de tempo de serviço em vez de 15 meses pelas regras da MP até dezembro de 2010.

 

No caso do segundo período de contagem especial, a duplicação, por exemplo, de sete meses de trabalho dentro de um ano civil não será equivalente a catorze meses e sim a doze, pois a contagem limita-se a doze meses. Segundo o governo, no decorrer dos anos deverá ser feita uma avaliação do resultado das regras simplificadas de contratações temporárias previstas na MP 410/07, o que poderá indicar não ser mais necessária a concessão de tratamento diferenciado a esses trabalhadores.

 

4 ATIVIDADE EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR

 

O art. 195, § 8º, da CR/88 prevê que, para restar caracterizada a situação de “segurado especial”, não é possível que no núcleo familiar haja empregados permanentes.

 

A principal exigência para a caracterização da figura do “segurado especial” – como previsto no art. 195, § 8º, da CR/88 – é a constatação de que a atividade rural 
desenvolvia-se em “regime de economia familiar”. Não é tarefa complexa enunciar um 
conceito de economia familiar, já que se encontra positivado no art. 11, § 1º, da Lei nº 
8.213/91: “Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho


dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem utilização de empregados”. Ao revés, as dificuldades apresentam-se à medida que os casos específicos passam a ser analisados  e surgem questionamentos sobre a possível descaracterização do regime de economia familiar em face da incidência de fatos específicos.

 

A dimensão da área rural é, sem dúvida, um indicativo de que o autor necessitaria de empregados constantes, uma realidade que, se comprovada, descaracterizaria o regime de economia familiar.

 

Tal dimensão, entretanto, não deve ser considerada como um fator absoluto, pois se deve levar em conta, por exemplo, que a criação de gado de corte necessita de grandes áreas de pastagens. Como o trato com tais animais é relativamente simples, o manejo poderia ser efetivado pela família. Também deve-se observar a peculiaridade geográfica de cada estado, onde grande parte da áreas rurais estão encravadas em vales. A maioria dos terrenos tem áreas montanhosas que, na prática, não servem para a agropecuária. As restrições legais de preservação das matas nativas também in?uenciam no aproveitamento do espaço rural. Assim, cada caso 
deve ser analisado de per si para constatar se a dimensão do terreno é um fator que pode afetar o conceito de “economia familiar”.

 

No entendimento do STJ, 5ª Turma, Resp nº 540.900/RS, DJ de 25/5/2004; STJ, 5ª Turma, Resp nº 529.460/PR, DJ de 23/8/2004, bem como o Enunciado nº 30 da Súmula de Jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais: “Tratando-se de demanda previdenciária, o fato do imóvel ser superior ao modulo rural não afasta, por si só, a qualificação de seu proprietário como segurado especial, desde que comprovada, nos autos, a sua exploração em regime de economia familiar.”

 

4.1 Meeiros descaracterizam a atividade em regime de economia familiar?

 

O contrato de meação caracteriza-se pela cessão onerosa de parte do terreno de um proprietário, para que outro trabalhador rural a explore. Como retribuição, o proprietário recebe um percentual in natura da produção agrícola, 
geralmente 50%. Essa é a origem do termo meeiro, uma referência à metade da produção.

 

O benefício da aposentadoria rural por idade da Lei nº 8.213/91 
aplica-se ao meeiro. A presença de meeiros é necessária, como uma forma de viabilizar a exploração da terra. Duas famílias em um mesmo terreno diminuem as distâncias no campo, em face da solidariedade que, via de regra, nasce entre elas. Na prática, as famílias passam a interagir, como se pertencessem a um único grupo familiar, ampliado. Surge, assim, uma cooperação essencial, mútua e contínua, só que efetivada por pessoas que não mantém, entre si, vínculos familiares: o proprietário e o meeiro.

 

A existência de uma ou duas famílias em propriedades rurais, não representam um diferencial econômico com materialidade relevante para descaracterizar o “regime de economia familiar”.

 

O INSS tem entendimento administrativo através do qual a destinação de até 50% da propriedade a meeiros, que também trabalhem a terra, não descaracteriza 
o “regime de economia familiar”.

 

 

4.2 Pequenos comércios descaracterizam a atividade rural em regime de economia familiar?

 

Devido às grandes distâncias das propriedades rurais em relação aos centros comerciais, nascem no campo as pequenas mercearias onde o lavrador comercializa o excedente de sua produção agrícola.

 

Como é impossível vender apenas milho, feijão e arroz, para atrair clientes, também são comercializados produtos de higiene pessoal, enlatados, refrigerados.

 

Considerando que na zona rural a circulação de dinheiro é altamente restrita, os produtos industrializados comercializados, normalmente são no regime de consignação, ou seja, o produtor rural pagará somente pela mercadoria deixada em consignação que for efetivamente vendida.

 

Para se apurar se o pequeno comércio descaracterizaria a atividade rural em regime de economia familiar, há que se investigar a representatividade da tal mercadinho dento do orçamento familiar. Neste sentido é a previsão do art. 3º, III, da Lei nº 11.326/06 ao normatizar que o “agricultor familiar” deverá ter sua renda familiar composta, predominantemente, pelo exercício da atividade rural. Predominantemente indica o norte interpretativo econômico necessário para efetuar ponderações caso a caso, afastando a realidade de segurado especial apenas daqueles trabalhadores rurais que se transformaram, realmente, em comerciantes.

 

4.3 A existência de máquinas descaracteriza o regime de economia familiar?

 

O trabalho no campo tem sido alvo de maior preocupação governamental nas duas últimas décadas. Verbas públicas têm sido constantemente aplicadas em pesquisa agrárias para melhorar a eficiência do trabalho no campo. A partir de tais pesquisas, máquinas e procedimentos têm sido desenvolvidos.

 

No início, tais avanços científicos eram de difícil acesso aos pequenos produtores rurais, mas com diminuição dos custos e com créditos agrícolas subsidiados pelo Governo, o maquinário e as técnicas contemporâneas puderam ser adquiridos pelos pequenos trabalhadores rurais.

 

Não me parece hábil, portanto, que o fato de pequenos trabalhadores rurais terem adotado procedimentos de manuseio de sua produção agrícola com pequenas máquinas de beneficiamento ou com veículos agrícolas, que aumentem o rendimento da atividade familiar, possa descaracterizar tal atividade como realizada em regime de economia familiar. Pensar desse modo seria negar ao trabalhador rural acesso ao desenvolvimento tecnológico,como previsto no art. 219 da CR/88.

 

O benefício do art. 143 da Lei nº 8.213/91 não é assistencial, 
mas previdenciário. Assim, para restar caracterizada a figura do “segurado especial”, 
o trabalhador rural não necessita viver nem em total pobreza, nem nas trevas científicas. Basta que o uso de tal tecnologia seja razoável à realidade familiar e não se apresente como atividade empresarial, nos termos do art. 966 do CC.

 

4.4 Auxílio de empregados eventuais

 

O art. 195, § 8º, da CR/88 – ao classificar os “segurados especiais” – foi claro ao afirmar que tal classificação não restará desnaturada se o segurado fizer uso de empregados eventuais. Trata-se dos safristas, contratados temporariamente e quando necessário, para auxiliar na colheita da safra.

 

A quantidade desses trabalhadores em relação aos membros da família será um indicativo a ser analisado sobre o volume da produção, o que poderia caracterizar uma atividade empresarial em vez de economia familiar. Por outro lado, como a vedação constitucional está ligada ao uso de empregado permanentes, nada a princípio, impede que um trabalhador rural tenha empregados eventuais.

 

5 DOS CÔNJUGES

 

5.1 Esposa de trabalhador rural exercendo a atividade urbana

 

O INSS insiste em afirmar que o fato da esposa do trabalhador rural exercer qualquer atividade urbana afastaria o regime de economia familiar da atividade rural desenvolvida pelo marido.

 

Tal entendimento não pode ser levado ao pé da letra. O fato de a esposa de um trabalhador rural exercer outra atividade impede que seja considerada “segurada especial”. Ela não pode perceber a aposentadoria rural do art. 143, mesmo que, na prática, tenha exercido atividades rurais de forma paralela ao exercício da atividade urbana. Tal limitação, entretanto, não pode transcender a seu cônjuge.

 

No Prorural, havia um dispositivo expresso no sentido de que o benefício rural só seria devido a um componente da unidade familiar (art. 4º da Lei Complementar nº 11/71).

 

Entretanto, essa discussão perdeu boa parte de sua força argumentativa face ao art. 3º, III, da Lei nº 11.326/06 ter normatizado que a caracterização de “agricultor familiar” requer que o grupo “tenha renda familiar predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento”. O termo “predominantemente” indica clara ?exibilização exegética para reconhecer a possibilidade de alguns membros da família não exercerem atividades rurais. Seria o caso não apenas da esposa, mas talvez de um dos filhos trabalhar na cidade e morar no campo com seus pais.

 

5.2 Marido de trabalhadora rural exercendo a atividade urbana

                  

A Turma Nacional de Uniformização reconheceu em 16/3/2005, que esposa pode ter aposentadoria rural, mesmo sendo marido trabalhador urbano, desde que a mulher comprove ter trabalhado exclusivamente na lavoura, ainda que o seu marido seja aposentado como trabalhador urbano.

 

Esse foi o entendimento da Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais no julgamento de incidente de uniformização apresentado por Leonora Pittol contra decisão da Turma Recursal do Paraná, que indeferiu seu pedido de aposentadoria rural.

 

No seu acórdão, a TR-PR alega que a autora seria desqualificada como segurada especial, "embora indefectíveis as provas no sentido de que ela realmente exerceu atividade agrícola", diante do fato de que o sustento de sua família não depende unicamente da lavoura, uma vez que seu esposo percebe aposentadoria urbana.
 

No incidente apresentado à Turma Nacional, a autora argumenta que a decisão da TR-PR diverge de jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo a qual a autora não é descaracterizada como segurada especial pelo fato de seu marido ser aposentado urbano, se ela comprovou haver trabalhado exclusivamente na lavoura. Ela apresentou como paradigmas os acórdãos no Recurso Especial (Resp) 289.949/SC e Agravo de Instrumento (AG) 215.629/SC. A Turma Nacional conheceu do pedido da autora e deu-lhe provimento (processo original nº 2003.70.02.001748-3).

 

5.3 Doméstica x Lavradora

 

A profissão de doméstica, muito comumente utilizada na sociedade brasileira, é na verdade uma expressão que deve ser relativizada, principalmente quando se trata de pessoa que reside em zona rural. É do costume de muitos anos, e assim, passado de pais para filhos que quem era lavrador era o homem, enquanto a esposas deveriam ser enquadradas como domésticas, ou do lar, e isso ocorre até os dias atuais devido não só a cultura como também ao desconhecimento das leis.

 

Contudo, na prática, muitas vezes, o que ocorre é uma impropriedade nominal, já que a maioria das mães de família do campo se desdobram para conseguir realizar as tarefas da casa, e ainda auxiliar toda a família no plantio e colheita de culturas que são indispensáveis à subsistência de todo o grupo familiar.

 

No entanto tal confusão nominal decorrente da própria cultura dos moradores da zona rural, vem acarretando diversas injustiças quando as lavradoras precisam ser amparadas pelo INSS.

 

A autarquia, muitas vezes, fazendo uma interpretação restritiva, indefere requerimentos de benefícios de trabalhadoras rurais, por constar em registros de casamento, fichas de matrícula escolar dos filhos e outros documentos, a profissão de doméstica e não de lavradora. Ocorre que deve ser analisado o caso concreto, através de documentos, bem como testemunhas, e não se ater a formalidades equivocadas.

 

Já os entendimentos jurisprudenciais tem apontado no sentido de amparar as lavradora que se qualificaram erroneamente como domesticas, senão vejamos: “A qualificação profissional de lavrador ou agricultor do marido constante dos assentamentos de registro civil, é extensível à esposa, e constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural, corroborada com os depoimentos testemunhais.” (REsp n. 272.365/SP, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, publ. no DJ-I de 12.03.2001, pág. 169)

 

6 IMPORTÂNCIA DO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA RURAL E DEMAIS BENEFÍCIOS

 

A regulamentação do Sindicalismo rural aconteceu apenas em 1962, porém, desde 1903, se registraram as primeiras tentativas legais de organização sindical do trabalhador Rural. No final da década de 40 surgem as primeiras organizações de trabalhadores no campo, que do ponto de vista da regulamentação sindical, aparou-se na possibilidade de organização em quatro categorias: trabalhadores na lavoura, trabalhadores na pecuária e similares, trabalhadores na produção extrativa e produtores autônomos. A partir de meados dos anos 50, apareceram diferentes categorias de trabalhadores em luta (meeiro, foreiro, colonos, camaradas, poceiros e etc).

 

A partir de 1965, o regime militar unificou todas categorias numa única forma organizativa: Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), sendo que em nível estadual, criou-se a Federação dos Trabalhadores Rurais na Agricultura (FETAG). De toda forma, a sindicalização dos trabalhadores rurais (pequenos produtores, pequenos proprietários, posseiros e assalariados), surgiu no bojo um amplo processo de mobilização pela regulamentação dos contratos de arrendamento e parceria por direitos trabalhista e por reforma agrária, “bandeira” essa que atravessou as últimas três décadas e tornou-se o baluarte e a principal frente de combate dos camponeses do Brasil.

 

Entre 1988 e 1990, os dados do IBGE revelaram que cerca de 59% dos presidentes dos STR´s eram pequenos proprietários, 23 a 25% eram arrendatários/parceiros/posseiros e apenas 13% eram assalariados. Sem contar, que nesse período, a presença marcante e o trabalho abnegado de militantes de diferentes filiações ideológicas, abrigados em ONG´s, mas principalmente, os ligados à igreja católica. Destacando-se a partir de 1975 a CPT (Comissão Pastoral da Terra) e as Comunidades Eclesiais de Base (CEB´s) que, conseguiram introduzir questões políticas relevantes à ação sindical. Isso fez com que os Sindicatos mostrassem o caráter de classe de sua existência, atuando junto a posseiros, pequenos produtores e assalariados, deixando marcas até hoje e tendo muita importância nas definições de rumos que se materializaram na CONTAG. Assim, fica clara a importância do desenvolvimento sindical para o fortalecimento da agricultura familiar.

 

Os sindicatos rurais são de grande relevância também no dizem respeito às orientações previdenciárias a seus filiados, muitas vezes contando inclusive com atendimento jurídico. Dessa forma, os lavradores, em sua maioria leigos da legislação previdenciária vigente, tem o Sindicato como um aliado na hora de requerer algum benefício junto à Previdência Social.

 

Assim os filiados conseguem orientação quanto à documentação a serem apresentadas, procedimentos a serem adotados e os Sindicatos fornecem ainda a importante “declaração de exercício rural”, assinada normalmente pelo Presidente do Sindicato. Este documento é de suma importância aos lavradores, principalmente aos que requerem a aposentadoria rural por idade, sendo esta declaração comumente, o primeiro documento solicitado pelo INSS, já que pelo período declarado pelo Sindicato como de efetivo exercício do trabalho rural do requerente, é que a Autarquia se baseia como referencia e solicita outras provas de trabalho rural.

 

6.1 Enquadramento como empregador na legislação sindical

 

O INSS apegado a uma classificação legal para afastar o conceito de “regime de economia familiar”, devido ao fato de que a legislação sobre contribuição sindical rural normatizar duas grandes classificações para o homem que labuta no campo: (a) trabalhador rural e (b) empresário ou empregador rural.

 

O problema se deve ao fato de que na segunda classificação (“empresário ou empregador rural”) são aglutinados, em um mesmo grupo, os efetivos “empresários rurais” – assim tipificados nos termos do art. 966 do CC (não raramente com vários trabalhadores efetivos) – e os “trabalhadores rurais em regime de economia familiar”.

 

A nomenclatura dificulta a conclusão e pode induzir o Autarquia (INSS) e os Juízos a erro. O trabalhador rural em regime de economia familiar é classificado pela legislação sindical como empresário ou empregador rural. Sob essa ótica, a classificação em tela deverá ser interpretada com grande cautela para não se considerar um segurado especial como sendo um empregador rural.

 

7 ATIVIDADE RURAL ANOTADA NA CTPS

 

Os trabalhadores rurais, muitas vezes, por desconhecerem seus direitos, acabam aceitando fazer contratos de parcerias fictícios, quando na verdade tratam-se efetivamente trabalhadores rurais.

 

Por outro lado, se procuram a Justiça do Trabalho para reivindicarem seus direitos trabalhistas, tem, após terem alcançado êxito nas ações trabalhistas, que ingressarem novamente na Justiça contra o INSS para verem reconhecidas as sentenças trabalhistas.

 

Para pacificar este entendimento foi editada a Súmula n. 31 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados que dispõe o seguinte: “A anotação na CTPS decorrente de sentença trabalhista homologatória constitui início de prova material para fins previdenciários.”

 

8 O CÔMPUTO DA ATIVIDADE RURAL PARA CONCESSÃO DE OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS

 

O pedido de cômputo do período laborado como trabalhador rural – seja como empregado seja como segurado especial – por ocasião da aposentadoria do requerente no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), para trabalhadores em geral, ou no Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), para servidores públicos, ambos regimes contributivos vem aumentando as demandas judiciais.

 

Trata-se de pretensão do segurado no sentido de se aposentar após exercer atividade urbana contributiva ou atividade pública também contributiva, mas computando como tempo de serviço o período no qual exerceu, na sua juventude, atividades no campo.

 

É de se ressaltar que é desnecessário que o trabalhador rural e o segurado 
especial, que tenham exercido tal atividade rural antes do advento da Lei nº 8.213/91 
(24/7/1991), exibirem prova de contribuição previdenciária.

Assim, há três hipóteses de aproveitamento do período de trabalho rural efetivo nos termos do art. 143:

 

·        para aposentadoria pelo RGPS de empregado urbano regido pela CLT;

·        para aposentadoria pelo RGPS de servidor público regido pela CLT;

·        para aposentadoria pelo RPPS de servidor público regido por estatuto próprio.

 

Nos dois primeiros casos (aposentadoria pelo RGPS de empregado urbano ou servidor regidos pela CLT), não há maiores discussões. Por se tratar de benefício regido pelo mesmo regime previdenciário – o Regime Geral de Previdência Social –, o cômputo do período de trabalho faz-se diretamente. Para tanto, basta que o interessado prove que trabalhou no campo na condição de empregado rural em qualquer período; ou que trabalhou no campo na qualidade de “segurado especial”, sem contribuir até 
24/7/1991, ou após essa data com contribuição. A jurisprudência é farta e pacifica nesse sentido.

 

Já no que tange aos casos de aposentadorias pelo RPPS de servidores públicos em regime estatutário, há divergência jurisprudencial. A questão teve 
início com a decisão do STF, em sede de cautelar na Adin-MC nº 1.664/DF, através da  qual o Pretório Excelso entendeu que não poderia ser computado o tempo de atividade rural – nos termos do art. 143 da Lei nº 8.213/91 – para acrescentar tempo de serviço à aposentadoria do servidor público pelo Regime Próprio da Previdência Social.

 

O ponto principal desse entendimento tem sido a afirmação no sentido de que o benefício do art. 143, por ser do RGPS, não poderia interagir com o RPPS. Com base em tal entendimento, várias decisões ainda têm sido proferidas no mesmo sentido. Ocorre que parece existir uma mudança jurisprudencial. A Adin-MC em tela foi extinta sem julgamento de mérito consoante decisão de 20/3/2002, e a própria corte já se manifestou posteriormente no sentido de que a contagem recíproca é um direito assegurado pela Constituição do Brasil.

 

O fato de haver mudança de regimes não é fundamento 
para negar o cômputo da atividade rural aos servidores públicos em face da previsão do art. 201, § 9º da CR/88. Tal dispositivo normatiza explicitamente que: “Para efeito de aposentadoria é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente”.

 

Assim, equiparadas as três situações, todos os trabalhadores rurais – sejam empregados rurais sejam segurados especiais – que tenham deixado o labor no campo poderão computar o tempo de tal labor exercido até 24/7/2006 para aposentadoria, tanto pelo RGPS quanto pelo RPPS. Entretanto, há que se destacar que – por ocasião da concessão do benefício do RGPS ou do RPPS acrescido da atividade rural não contributiva –o período rural não contributivo não poderá ser computado para efeito de carência do benefício do RGPS ou do RPPS, nos termos do art. 55, § 2º, in fine da Lei nº 8.213/91.

 

Neste sentido é o enunciado nº 24 da Súmula de Jurisprudência da TNU: “O tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior ao advento da Lei nº 8.213/91, sem o recolhimento de contribuição previdenciária, pode ser considerado para a concessão de benefício previdenciário do Regime Geral de Previdência Social, exceto para efeito de carência, conforme a regra do art. 55, § 2º, da Lei nº 
8.213/91
”.

 

9 ACUMULAÇÃO DE APOSENTADORIA RURAL E PENSÃO POR MORTE

 

Popularmente na zona rural é comum afirmar que fulano de tal não pode receber aposentadoria rural e pensão por morte pois tem que escolher apenas um.

 

O art.167 do Decreto nº 3.048/99 esclarece esta dúvida dispondo o seguinte:

 

Salvo no caso de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios da previdência social, inclusive quando decorrentes de acidente do trabalho:

            I- aposentadoria com auxílio-doença;

            II- mais de uma aposentadoria;

            III- aposentadoria com abono de permanência em serviço;

            IV- salário-maternidade com auxílio-doença;

            V- mais de um auxílio-acidente;

            VI- mais de uma pensão deixada por cônjuge;

            VII - mais de uma pensão deixada por companheiro ou companheira;

VIII - mais de uma pensão deixada por cônjuge e companheiro ou companheira; e

            IX - auxílio-acidente com qualquer aposentadoria.

§ 1º No caso dos incisos VI, VII e VIII é facultado ao dependente optar pela pensão mais vantajosa.

§ 2º É vedado o recebimento conjunto do seguro-desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da previdência social, exceto pensão por morte, auxílio-reclusão, auxílio-acidente, auxílio-suplementar ou abono de permanência em serviço.

§ 3º É permitida a acumulação dos benefícios previstos neste Regulamento com o benefício de que trata a Lei nº 7.070, de 20 de dezembro de 1982

§ 4º O segurado recluso, ainda que contribua na forma do § 6º do art. 116, não faz jus aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria durante a percepção, pelos dependentes, do auxílio-reclusão, permitida a opção, desde que manifestada, também, pelos dependentes, pelo benefício mais vantajoso. (Parágrafo acrescentado pelo Decreto nº 4.729, de 9/06/2003

 

10 CONCLUSÃO

 

Diante todo ora apresentado, fica claro a grande evolução da legislação previdenciária no sentido de amparo aos rurícolas. A jurisprudência vem aperfeiçoando e ampliando os direitos previdenciários do homem e da mulher do campo às peculiaridades de cada caso concreto e às especialidades da profissão.

 

Um exemplo disso é a flexibilização dos documentos hábeis à comprovar ou constituir inicio de prova material do exercício do trabalho rurícola, demonstrada pelo seguinte entendimento: “Não se deve aplicar rigor excessivo na comprovação da atividade rurícola, para fins de aposentadoria, sob pena de tornar-se infactível, em face das peculiaridades que envolvem o Trabalhador do campo. O rol de documentos hábeis a comprovar o labor rural, elencados pelo art. 106, parágr. único da Lei 8.213/91, é meramente exemplificativo. Precedentes do STJ.” (STJ. Resp nº 980065/SP DJU de 17-12-2007).

 

O estudo do presente instituto de aposentadoria rural foi de grande importância principalmente para restar demonstrado que dentro da categoria de lavradores que exercem a atividade em regime de economia familiar, existe uma diversidade de famílias, que cada uma a seu modo, exerce o trabalho rural, ora com ajuda de meeiros, de empregados eventuais, com algum membro exercendo o trabalho urbano e com imóveis rurais nos mais variados tamanhos.

 

Assim o importante é analisar o caso concreto, devendo o técnico administrativo do INSS angariar todas as informações necessárias, através de documentação e depoimentos, sem julgar precipitadamente, partindo de pré-conceitos formados, o que por vezes acaba no indeferimento ilegal do benefício. Inclusive quando necessário, deve o servidor valer-se da possibilidade concedida pelas Instruções Normativas da Autarquia, de se fazer uma pesquisa in loco para comprovar os fatos alegados. O mesmo deve ser considerado quando se tratar de trabalhadora rural, que equivocadamente se declara doméstica em algum documento, devendo ser levado em consideração a realidade prática da mesma e sua família, em detrimento a nomenclatura da profissão. 

 

Vale ressaltar que é de grande valia, a utilização da documentação do marido da requerente em casos de aposentadoria rural. Se o mesmo já é aposentado como trabalhador rural, seu processo administrativo deve ser usado, podendo ser considerado prova subsidiária. E também ao contrário, caso a esposa se aposente primeiro, pois na maior parte das vezes como o trabalho é exercido em regime de economia familiar, as provas do exercício da atividade rural de um cônjuge se estende ao outro, podendo ser utilizado como prova emprestada na busca da verdade.

 

Ademais todo o apresentado, é necessário o apoio dos próprios Governantes para investir na conscientização dos trabalhadores rurais à filiação aos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais, visto sua demasiada importância no auxílio para concessão mais descomplicada e rápida dos benefícios previdenciários, haja vista a grande importância da declaração de atividade rural fornecida pelo Sindicato, como prova do trabalho rurícola.

 

REFERÊNCIAS

 

BRASIL. Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971

 

BRASIL, Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências.

 

BELTÃO, Kaizô Iwakami; OLIVEIRA, Francisco Eduardo Barreto; PINHEIRO, Sonoê Sugahara. “A população rural e a previdência social no Brasil: Uma análise com
ênfase nas mudanças constitucionais”
 Texto para discussão nº 759. Rio de Janeiro:
IPEA, set/ 2000.

 

JORGE, Társis Nametala Sarlo. Teoria Geral do Direito Previdenciário e Questões Controvertidas do Regime Geral, do Regime dos Servidores Públicos e dos Crimes Previdenciários. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

 

ROCHA, Daniel Machado da; BALTHAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

 

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 6. ed. São Paulo: LTr, 2005.

 

SILVA, Paula Luciana da. Aposentadoria e o efeito multiplicador. Uma análise da renda previdenciária em São Pedro de Joselândia Barão de Melgaço - MT, período julho de 2004 (UFMT) IV JCEA - Campo Grande, MS, Brasil, 6 a 8 de outubro de 2004.<Disponível em http://www.ufms.br/dea/oficial/HTM/artigos/economia/Desenvolvimento%20Econ%F4 ico/aposentadoria%20rural.pdf> Acesso em: 10 jan. 2009

 

BRASIL, Lei nº 11.326/06 de 24 de julho de 2006. Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais.

 

BRASIL. LEI Nº 11.718 DE 20.06.2008 D.O.U.: 23.06.2008 Acrescenta artigo à Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973, criando o contrato de trabalhador rural por pequeno prazo; estabelece normas transitórias sobre a aposentadoria do trabalhador rural; prorroga o prazo de contratação de financiamentos rurais de que trata o § 6º do art. 1º da Lei nº 11.524, de 24 de setembro de 2007; e altera as Leis nºs 8.171, de 17 de janeiro de 1991, 7.102, de 20 de junho de 1993, 9.017, de 30 de março de 1995, e 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991.

Guia do trabalhador rural: saiba como utilizar o seu seguro social. - 2. ed. – Brasília: MPS, ACS, 2007. 36 p.

 

BRASIL. Site Superior Tribunal de Justiça.

 

BRASIL. Site Câmara dos Deputados.

 

BRASIL. Site Senado Federal.