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Greve do INSS e da Justiça Federal- a culpa é dos servidores ou do governo?  Opinião de uma advogada

Fernanda Carvalho Campos e Macedo, advogada Sócia Proprietária do Escritório Carvalho Campos & Macedo Sociedade de advogados; Pós-graduada em Direito Público pela Universidade Federal de Juiz de Fora; Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus; Especialista em Direito Previdenciário.

 

Servidores do Poder Judiciário da União e do INSS já estão há alguns meses de greve em busca por reposição salarial. A população sofre com a greve e vários setores da sociedade (inclusive advogados) acabam jogando toda a culpa nos servidores. Será que isso é justo?

 

Sou advogada e tento basear minhas opiniões sempre através do bom senso e imparcialidade. Apesar de também, ser uma das prejudicadas pela greve e ver meus clientes do RGPS em situação de abandono por muitos órgãos públicos, mormente, pelo INSS, não posso jogar essa conta para os “ servidores públicos”, que também são vítimas de um sistema de governo ineficaz e falido.

 

O código de ética que rege a atuação de um advogado, assim dispõe em seu preâmbulo:

 

“O CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, ao instituir o Código de Ética e Disciplina, norteou-se por princípios que formam a consciência profissional do advogado e representam imperativos de sua conduta, tais como: os de lutar sem receio pelo primado da Justiça; pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei, fazendo com que esta seja interpretada com retidão, em perfeita sintonia com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum; ser fiel à verdade para poder servir à Justiça como um de seus elementos essenciais; proceder com lealdade e boa-fé em suas relações profissionais e em todos os atos do seu ofício; empenhar-se na defesa das causas confiadas ao seu patrocínio, dando ao constituinte o amparo do Direito, e proporcionando-lhe a realização prática de seus legítimos interesses; comportar-se, nesse mister, com independência e altivez, defendendo com o mesmo denodo humildes e poderosos; exercer a advocacia com o indispensável senso profissional, mas também com desprendimento, jamais permitindo que o anseio de ganho material sobreleve à finalidade social do seu trabalho; aprimorar- se no culto dos princípios éticos e no domínio da ciência jurídica, de modo a tornar-se merecedor da confiança do cliente e da sociedade como um todo, pelos atributos intelectuais e pela probidade pessoal; agir, em suma, com a dignidade das pessoas de bem e a correção dos profissionais que honram e engrandecem a sua classe.” ( grifos meus)

 

Infelizmente, tenho visto em diversos meios de comunicação profissionais literalmente “atirando pedras” nos servidores públicos federais que aderiram à greve como se fossem, data vênia, “inimigos do Estado e da sociedade”.

 

Ora, como acima citado, nosso Código de ética diz que devemos “lutar sem receio pelo primado da Justiça; pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei, fazendo com que esta seja interpretada com retidão, em perfeita sintonia com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum”.

 

Se o que os servidores reivindicam é justamente o cumprimento pelo Governo Federal da Constituição Federal em seu artigo 37, inciso X (que prevê o reajuste anual de seus vencimentos que lhes possibilite manter o poder de compra) quem é o vilão dessa história? Contra quem devemos, nós advogados e demais profissionais, lutar?

 

Por óbvio que os seguraos do INSS e o jurisdicionado que depende da Justiça Federal, trabalhista e eleitoral não são os culpados pela corrosão inflacionária nos salários dos servidores.  E de quem é essa culpa?

 

A greve dos servidores públicos é um Direito Constitucional que lhes é assegurado para reivindicar os seus direitos, assim como também é garantido aos trabalhadores da iniciativa privada. Os servidores públicos, até hoje, sequer tiveram regulamentado o direito à “data-base” para ter seus vencimentos reajustados anualmente. Seria isso justo?

 

Nós, advogados, que precisamos dos órgãos públicos para “trabalhar e prover nosso sustento” ficamos muito prejudicados em situações de greve daqueles órgãos. Mas o que devemos fazer em relação a isso para sermos, realmente, justos e éticos? Devemos atacar os servidores públicos ou nos unir a eles para reivindicar do “Governo” o que é nosso por direito (eles, o direito ao reajuste anual dos seus vencimentos; nós advogados o direito de atuar profissionalmente sem as barreiras impostas pela greve).

 

Se cobrássemos dos Poderes Estatais a regulamentação de uma Data-base real para os servidores públicos federais, não teríamos mais greve e, com isso, todos sairiam ganhando: os advogados, os servidores e a sociedade. O que não é justo é cair na mácula perversa do governo que coloca os setores da sociedade em situação de guerra de todos contra todos.

 

Temos assistido diuturnamente a um cenário de falência do Estado Democrático de Direito. O Poder Executivo se aparelhando dentro do Poder Legislativo e do Poder Judiciário no seu projeto de dominação.  Ministros do Supremo Tribunal Federal (nomeados pelo Presidente da República) que, hoje, atuam mais como longamanus do Executivo do que como seu freio e contrapeso.[1] (Observem a tendência do STF em defender a economia do país em detrimento de direitos fundamentais assegurados pela Carta Magna).

 

Inúmeras denúncias de corrupção sistêmica. Desvios de bilhões de reais dos nossos cofres, e a conta vai para quem? Para nós mesmos com: aumento na tributação; crescimento da inflação; não reajuste de salários; não investimento em serviços públicos (quando se desvaloriza o servidor, o serviço público também perde qualidade) etc.

 

Enfim, sou advogada, atuo no ramo do Direito Previdenciário junto ao INSS e estou, assim como vários colegas, tendo sérios prejuízos com a greve. Mas também defendo os interesses dos Servidores Públicos e não posso me furtar ao dever de lealdade e justiça com as suas causas, punindo-os por exercerem o seu direito.

 

Deixo à reflexão dos colegas para que calculem quem é o nosso “algoz comum”, o servidor que reivindica seus direitos através do único instrumento que tem (greve) ou o Governo Federal que atua em todas as esferas de Poder fazendo com o que os oprimidos (nós advogados e sociedade) lutemos contra outros oprimidos (os servidores públicos)?

 

Contato: carvalhocamposadvocacia@hotmail.com

www.carvalhocamposadvocacia.com.br

 

 


[1] http://www.alanprofessordireito.com.br/artigos-e-textos-do-professor/220-os-poderes-da-republica-e-suas-interpretacoes-da-constituicao