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Evolução jurisprudencial da aposentadoria compulsória de servidor ocupante exclusivamente de cargos em comissão

Kleber Vinicius Bezerra Camelo de Melo

Defensor Público Federal. Especialista em Direito Tributário e Finanças Públicas (IDP/2011). Especialista em Direito Processual nos Tribunais Superiores (UniCEUB/2013).


A aposentadoria compulsória, em se tratando de servidor ocupante exclusivamente de cargo em comissão, não é tema pacífico em sede doutrinária. A título de exemplo, discorrendo o preceito constitucional contido no art. 40, caput, da CF, José dos Santos Carvalho Filho avalia que:

 

“O mandamento constitucional instituiu como suporte fático do benefício, uma presunção absoluta (Iuris et de iure) de incapacidade do servidor, presunção essa que não cede à prova em contrário. Significa dizer que mesmo atingindo 70 anos de idade em plenas condições de exercer a sua função, o servidor não tem escolha: deverá ser aposentado compulsoriamente e, em consequência, afastado do serviço público” (SANTOS FILHO,  José Carvalho do. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2011, p. 641).

 

Portanto, para o referido autor, presume-se absolutamente a incapacidade do servidor, quando este completa 70 anos de idade, independentemente de prova em contrário.

 

O referido entendimento encontrou eco na jurisprudência do STJ, a seguir:

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR OCUPANTE DE CARGOS EM COMISSÃO. EXONERAÇÃO POR IMPLEMENTO DE IDADE (70 ANOS). ILEGALIDADE. INEXISTÊNCIA. 1 - A expressão "servidor público" é gênero do qual faz parte o ocupante de cargo em comissão que, a exemplo do detentor de cargo efetivo, ao completar setenta anos de idade, não pode mais continuar na ativa, porque sua retirada para a inatividade é compulsória (obrigatória), não havendo falar em ilegalidade, porquanto, em última ratio, o fundamento do ato é a própria Constituição Federal (art. 40, §1º, inciso II). 2 - Recurso ordinário improvido. (RMS 10423/SP, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, SEXTA TURMA, julgado em 10/10/2000, DJ 30/10/2000, p. 197)

 

Assim, ocorreram manifestações, doutrinárias e jurisprudenciais, acerca da possibilidade de aplicação de aposentadoria compulsória (art. 40, §1º, inciso II, CF/88) a servidor ocupante de cargo em comissão.

 

Porém, recentemente, o STJ entendeu que não é aplicável a aposentadoria compulsória por idade na hipótese de servidor público que ocupe exclusivamente cargo em comissão. Trata-se de modificação de entendimento jurisprudencial. Segundo o referido tribunal superior:

 

MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL OCUPANTE DE CARGO EM COMISSÃO. IDADE SUPERIOR A SETENTA ANOS. APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. ART. 40, § 1º, II, E § 13 DA CF/88. INAPLICABILIDADE. EXONERAÇÃO BASEADA EXCLUSIVAMENTE NO FATO DE SER O IMPETRANTE SEPTUAGENÁRIO. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES. POSSIBILIDADE DE A AUTORIDADE IMPETRADA EXONERAR O IMPETRANTE POR OUTRO FUNDAMENTO OU MESMO SEM MOTIVAÇÃO EXPRESSA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO. 1. A discussão trazida no apelo resume-se em definir se a aposentadoria compulsória, prevista no art. 40, § 1º, II, da Constituição Federal de 1988, aplica-se ao servidor ocupante exclusivamente de cargo em comissão. 2. A regra constitucional que manda aposentar o servidor septuagenário (§ 1º, II) está encartada no artigo 40 da CF/88, que expressamente se destina a disciplinar o regime jurídico dos servidores efetivos, providos em seus cargos por concurso público. Apenas eles fazem jus à aposentadoria no regime estatutário. 3. Os preceitos do artigo 40 da CF/88, portanto, não se aplicam aos servidores em geral, mas apenas aos titulares de cargos efetivos. O § 13, reconhecendo essa circunstância, é claro quando determina que, "ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de previdência social" (excluído, obviamente, o regime de previdência disciplinado no art. 40 da CF/88). 4. Os servidores comissionados, mesmo no período anterior à EC 20/98, não se submetem à regra da aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade. O § 2º do art. 40 da CF/88, em sua redação original, remetia à lei "a aposentadoria em cargos ou empregos temporários". Portanto, cabia à lei disciplinar a aposentadoria dos servidores comissionados, incluindo, logicamente, estabelecer, ou não, o limite etário para a aposentação. 5. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça. 6. No caso, como a exoneração do impetrante deveu-se, exclusivamente, ao fato de ter mais de 70 anos, por força da teoria dos motivos determinantes, deve ser anulado o ato impugnado no mandamus, nada impedindo, todavia, que a autoridade impetrada promova nova exoneração ad nutum. 7. Recurso ordinário provido. (RMS 36.950/RO, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/04/2013, DJe 26/04/2013)

 

Assim, para o referido tribunal, os preceitos contidos no art. 40 da CF/88 não se aplicam aos servidores em geral, mas apenas aos titulares de cargos efetivos, eis que o §13 afastou tal aplicação, pois “ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão (...), aplica-se o regime geral de previdência”.

 

Em igual linha de pensamento o STF entende inaplicável a regra da aposentadoria compulsória aos que exercem atividade cartorária ou notarial, a seguir:

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PROVIMENTO N. 055/2001 DO CORREGEDOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. NOTÁRIOS E REGISTRADORES. REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS. INAPLICABILIDADE. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/98. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE EM CARÁTER PRIVADO POR DELEGAÇÃO DO PODER PÚBLICO. INAPLICABILIDADE DA APOSENTADORIA COMPULSÓRIA AOS SETENTA ANOS. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. O artigo 40, § 1º, inciso II, da Constituição do Brasil, na redação que lhe foi conferida pela EC 20/98, está restrito aos cargos efetivos da União, dos Estados-membros , do Distrito Federal e dos Municípios --- incluídas as autarquias e fundações. 2. Os serviços de registros públicos, cartorários e notariais são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público --- serviço público não-privativo. 3. Os notários e os registradores exercem atividade estatal, entretanto não são titulares de cargo público efetivo, tampouco ocupam cargo público. Não são servidores públicos, não lhes alcançando a compulsoriedade imposta pelo mencionado artigo 40 da CB/88 --- aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade. 4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.(ADI 2602, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 24/11/2005, DJ 31-03-2006 PP-00006 EMENT VOL-02227-01 PP-00056).

 

Portanto, pode-se dizer atualmente que o entendimento dos tribunais superiores é o de que não se aplica a aposentadoria compulsória aos que ocupam exclusivamente cargo em comissão.

 


Referências

 

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 24ª ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2011.


 

Como citar esse artigo:

 

MELO, Kleber Vinicius Bezerra Camelo de. Evolução jurisprudencial da aposentadoria compulsória de servidor ocupante exclusivamente de cargos em comissão. Instituto de Estudos Previdenciários, Belo Horizonte, ano 08, n.294, 27 Mar. 2014 . Disponível em: .