O BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA
Márcia Maria Araújo Silva – Especialista em Direito Previdenciário
RESUMO
Este trabalho objetiva estudar os critérios exigidos para a concessão do Benefício de Prestação continuada – BPC. Para melhor compreensão abordou-se o conceito da dignidade humana, pois a Constituição Federal a estabelece entre os fundamentos da República Federativa do Brasil. Este valor fundamental encartado na estrutura político-jurídica da Constituição é um princípio central do sistema jurídico e sobre o qual se erige e se organiza a sociedade. A Constituição Federal em seu art. art. 203 estabelece que a assistência social será prestada a quem dela necessitar independentemente da contribuição à seguridade social. Busca-se assim beneficiar os miseráveis, as pessoas que se encontram em estado de penúria e que são incapazes de sobreviver sem a ação da previdência, proporcionando-os uma vida digna. A Lei nº 8.742/93, denominada Lei de Organização da Assistência Social - LOAS - que regulamenta o dispositivo constitucional supracitado estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício. Esses são: pessoa portadora de deficiência incapacitada para a vida independente e para o trabalho e o idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. Questiona-se o critério de miserabilidade exigido por esse diploma bem como o conceito de incapacidade. Para a Lei nº 8.742/93 a família considerada hipossuficiente é aquela cuja renda familiar per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo. O idoso na referida lei é considerado aquele com 70 anos o que foi revogado com o Estatuto do Idoso – Lei nº 10.741/2003 –, que denomina idoso às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, todavia para a obtenção do benefício considera-se a idade de 65 anos. Outra questão bastante polêmica e controvertida é quanto à pessoa incapacitada, tendo em vista que a avaliação é muito subjetiva, pois o fato da pessoa realizar por conta própria atividades do cotidiano, tais como alimentar-se sozinho, realizar a própria higiene e outras atividades básicas não significa que este prescinde do benefício, o que há de ser observado é a capacidade para o trabalho, pois é por meio deste que uma pessoa poderá assegurar o seu sustento ou da sua família. Para explicar a norma contida na LOAS foi expedido o Decreto nº 6.214/2007 que estipula procedimentos a serem observados para a concessão do benefício.
Palavras-chaves – Constituição; assistência social; dignidade humana; benefício;
Lei de Organização da Assistência Social; idoso, pessoa
portadora de deficiência.
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho compreende um estudo sobre o Benefício de Prestação Continuada – BPC – previsto na Lei nº 8.742/93, conhecida como a Lei Organização da Assistência Social – LOAS.
Esse benefício foi criado para beneficiar as pessoas que se encontram em estado de penúria, numa situação de miserabilidade. Busca-se com isso proporcioná-las uma vida digna.
A dignidade da pessoa humana é prevista na Constituição Federal em seu art. 1º, inciso III, como um dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil. É um princípio basilar e vetor de todo o ordenamento jurídico. Há assim, de ser garantido a todos o direito de uma vida digna.
A assistência social encontra-se destacada na Constituição Federal, como pode ser verificado no art. 3º que erigiu a solidariedade como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. E o art. 203 da Carta Cidadã determina que a assistência social seja prestada a quem dela necessitar.
Para a efetivação dessa assistência foi editada a Lei nº 8.742/93 que definiu a assistência social como direito do cidadão e dever do Estado, de natureza não contributiva, que provê os mínimos sociais para garantir o atendimento às necessidades básicas, constitui um Benefício de Prestação Continuada – BPC – que é a garantia de um salário mínimo mensal devido à pessoa com deficiência e ao idoso, este considerado o de idade igual ou superior a 65 anos.
Para assegurar a fiel execução da Lei nº 8.742/93, em 26 de setembro de 2007, o Presidente da República expediu o Decreto nº 6.214. Este por sua vez, propicia facilidades para que aquela lei seja cumprida, tendo em vista que evidencia e explicita as previsões legais, removendo assim eventuais obstáculos práticos que impediam ou dificultavam a concessão do benefício.
2 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conhecida como a Constituição Cidadã em seu texto garante uma vida digna a seus cidadãos.
A dignidade da pessoa humana é o princípio basilar e máximo da ordem constitucional. Esse princípio é o verdadeiro valor-fonte que amolda e inspira todos os demais direitos. É a raiz e fundamenta todo o ordenamento jurídico, e a sociedade se constitui e se baseia sobre ele.
Alexandre de Moraes assim definiu a dignidade da pessoa humana:
A dignidade da pessoa humana: concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoais de Estado e Nação em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente á pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. (MORAES, 2005, p. 16),
Para Jair Eduardo Santana (1998, p. 57):
a dignidade da pessoa humana – está aqui abarcando não apenas um valor do homem na dimensão de sua liberdade, mas a própria estrutura do Estado que se constrói sobre esse elemento. O princípio se espaira desde o direito à vida até a ordem social.(SANTANA, 1998, p. 57)
José Afonso da Silva com muita clareza assim definiu a dignidade da pessoa humana:
Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida “concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais, observam Gomes Canotilho e Vital Moreira, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir “teoria do núcleo da personalidade” individual, ignorando-a quando se trate de direitos econômicos, sociais, e culturais”. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana. (SILVA, 1993, p. 96)
Nesse contexto surgem certos deveres de prestações positivas para o Estado, e entre esses deveres os direitos sociais nos termos do art. 6º da Constituição da República Federativa do Brasil, pois cabe ao Estado zelar pela efetividade dos direitos sociais, que visam à melhoria das condições de vida.
O Estado passou a ser devedor de direitos, e o cidadão passou a ser o seu credor. O homem é o sujeito de direito e, nunca o seu objeto.
3 SEGURIDADE SOCIAL
A seguridade social compreende um sistema integrado pelos poderes públicos e pela sociedade com fins de implementar ações destinadas a assegurar direitos relativos à saúde, a previdência e à assistência social.
Celso Barroso Leite(O conceito é exposto no Curso de Direito Previdenciário, org. Wagner Balera. São Paulo: LTR, 1992) citado por Marcelo Leonardo Tavares (2007, p. 1) assim definiu a seguridade social:
é o conjunto de medidas destinadas a atender às necessidades básicas do ser humano. Portanto, o direito da seguridade destina-se a garantir, precipuamente, o mínimo de condição social necessária a uma vida digna, atendendo ao fundamento da República contido no art. 1º, III da CRFB/88. (TAVARES, 2007, p. 1)
A Cstituição Federal colocou a assistência social no conjunto de políticas de seguridade social. Assim, a assistência social é uma das vertentes da seguridade social e está prevista no art. 203 que assim dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou e tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Este artigo foi regulamentado pela Lei nº 8.742/93 denominada LOAS, que a seguir será estudada.
4 LEI Nº 8.742/93 – Lei de Organização da Assistência Social – LOAS
A assistência social é uma política social destinada a prestar gratuitamente, proteção à família, maternidade, infância, adolescência, velhice e aos deficientes físicos e mentais, e está regulamentada na Lei nº 8.742/93. É definida como atividade complementar a seguridade social que é tripartida na Previdência Social, Assistência Social e Saúde.
A sua principal característica é a possibilidade de seus programas e benefícios serem usufruídos por qualquer pessoa, atendidos os requisitos da lei, independentemente de qualquer espécie de contribuição e tampouco a comprovação de tempo de serviço. O seu caráter é puramente assistencial.
A assistência social foi criada com o intuito de beneficiar os miseráveis, pessoas incapazes de sobreviver sem ação da previdência. Pois a responsabilidade pelo sustento das pessoas é inicialmente do círculo familiar e, supletivamente do Poder Púbico. Sendo assim, somente haverá direito às prestações assistenciais se não houver meios próprios ou familiares do sustento da pessoa.
O conceito de família para a Lei nº 8.742/93 é o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivam sob o mesmo teto, compreende o cônjuge, companheira ou companheiro, filho não emancipado, de qualquer condições, menor de 21 anos ou inválido, o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho.
Para efetivar essa assistência a Lei nº 8.742/93 prevê duas espécies de benefícios assistenciais de prestação continuada:
1 O amparo social à pessoa portadora de deficiência; e
2 O amparo social do idoso.
Esse benefício corresponde à garantia de um salário mínimo devido ao idoso e à pessoa portadora de deficiência. A idade para considerar a pessoa como idosa é de 60 anos conforme prevê o Estatuto do Idoso, mas a Lei nº 8.742/93, em seu art. 34 estabelece que o benefício mensal de um salário mínimo será devido ao idoso a partir de 65 anos.
É direito personalíssimo, não gera direitos à pensão por morte a herdeiros ou sucessores, extingui-se com a morte do beneficiado O benefício assistencial não poderá ser acumulado com qualquer auxílio da previdência social ou de qualquer outro regime previdenciário.
Repita-se que esse benefício tem caráter assistencial e, por isso, independe de contribuição para qualquer sistema. Pode ser provisório ou de forma permanente.
Permanente, se a pessoa estiver incapacitada para o trabalho por motivo de idade avançada ou deficiência física ou mental que a afaste das atividades laborais de forma definitiva.
Provisório se houver chance de habilitação ou reabilitação profissional.
Ele pode ser recebido desde o nascimento pelo deficiente físico quanto o mental. É destinado aos brasileiros natos e aos naturalizados e os estrangeiros domiciliados no Brasil, desde que não estejam amparados pelo sistema previdenciário do país de origem.
Poderá ser pago a mais de um membro da família, desde que comprovadas todas as condições exigidas.
Um fator determinante e polêmico para a concessão do benefício é o quanto a incapacidade da família de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa que a seguir estudaremos.
5 HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA
De acordo com o §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 a família considerada incapacitada para prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa é aquela cujo cálculo de renda per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo.
Esse valor restringiu de modo extremo e injusto a camada social das pessoas que possuem renda per capita pouco acima do limite estipulado, e que vivem em condições tão miseráveis quanto àquelas que atendem a esse requisito.
O STF na Adin nº 1.232- 1/DF julgou constitucional o art. § 3º, do art. 20 da LOAS cuja ementa transcrevemos:
Ementa: Constitucional. Impugna dispositivo de lei federal que estabelece o critério para receber o benefício do inciso v do art. 203, da CF. Inexiste a restrição alegada em face ao próprio dispositivo constitucional que reporta à lei para fixar os critérios de garantia do benefício de salário mínimo à pessoa portadora de deficiência física e ao idoso. esta lei traz hipótese objetiva de prestação assistencial do estado. ação julgada improcedente.
O valor legalmente estabelecido não pode ser interpretado de forma literal, e tem tido sua rigidez mitigada o que pode ser constatado pelos julgados ora transcritos:
o limite de ¼ do salário mínimo não é absoluto, pois deve ser considerado um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores eu tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade do autor. (AGRESP 52864/SP, Rel. Min. Félix Fischer).
Quando a renda per capita familiar for inferior ao de ¼ do salário mínimo a situação de desamparo e miserabilidade é presumida, o que não impede o deferimento do benefício quando a renda familiar for superior a este quantum, quando demonstrada a situação de hipossuficiência no caso concreto. Pois não há impedimento a concessão do benefício quando a miserabilidade é demonstrada por outros meios de prova, com outros fatores que venham a confirmá-la e estão presentes todos os requisitos justificadores da sua concessão.
A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª região no julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento Processo: 2002.04.01.046195-1, decisão em 13/02/2003 firmou o seguinte entendimento:
É de ser mantida a orientação de que o § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 deve ser interpretado no conjunto de leis que tratam da assistência social aos necessitados e sob o pálio da Constituição Federal, pois não haveria razão para tratamento diferenciado entre o que se considera "miserável" para os fins das Leis nºs 9.533/97 e 10.219/2001 (que tratam, respectivamente, do programa federal de garantia de renda mínima - PETI e da "Bolsa Escola") - onde se presume miserável aquele que tiver renda mensal per capita inferior a ½ do salário mínimo - e para a Lei nº 8.742/93, onde necessitado (miserável) somente será aquele que detiver renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo. Se, naqueles ordenamentos, se considera miserável quem tem renda inferior a meio salário mínimo, esse mesmo critério pode e deve ser aplicado aos aspirantes ao benefício assistencial de que trata a Lei nº 8.742/93. Não há como se admitir parâmetros diversos para situações idênticas, se, na realidade, importa mesmo saber quem é miserável, nos termos da lei.
A assistência social foi criada com o intuito de beneficiar as pessoas que se encontram em situação de penúria, pessoas incapazes de sobreviver sem a ação da previdência, tem em vista os miseráveis.
O benefício poderá ser pago a mais de um membro da família, desde que comprovadas todas as condições exigidas, ou seja, caso um grupo familiar contenha um idoso e um deficiente, os dois podem ter direito ao benefício.
Há de se observar que o benefício concedido ao deficiente passa a integrar a renda familiar para efeito de cálculo per capita e o benefício concedido ao idoso não a integra. Esta diferença foi estabelecida pela Lei nº 10.741/2003 que no art. 34, parágrafo único dispõe: “o benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita que se refere a Loas”. Assim, em uma família caso já exista um membro que receba o benefício previsto na LOAS, por ser deficiente, este rendimento comporá a renda familiar, o que poderá impedir nova concessão assistencial.
Frise-se que não compete à previdência social a manutenção de pessoas carentes; não tem por fim a complementação da renda familiar ou proporcionar maior conforto ao beneficiário.
A assistência como direito que é somente destina-se ao idoso ou deficiente em estado de penúria, que dele realmente necessitar, e prover os mínimos sociais e atender as necessidades básicas dos cidadãos, pois, esse é o comando constitucional.
6 A INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA A VIDA INDEPENDENTE
A incapacidade para a vida independente não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; não significa incapacidade para os atos da vida diária, para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; não pressupõe dependência total de terceiros.
A possibilidade de desempenho, por si só, de atividades básicas do dia-a-dia, tais como ser é capaz de comer, higienizar-se, caminhar sozinho, não pode ser entendida como vida independente.
A característica da deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade, vai além da incapacidade para o trabalho. Abrange limitação de desempenho de atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da incapacidade de inclusão social.
Assim, a pessoa portadora de deficiência para os efeitos da Lei nº 8.742/93 é aquela que apresenta incapacidade para o trabalho e para a vida independente, e que tal condição lhe cause dificuldade de integração social. É o cidadão portador de moléstia que não consegue se inserir no mercado de trabalho em razão de anomalias ou lesões irreversíveis de natureza hereditária, congênita ou adquirida.
A pessoa portadora de deficiência física ou mental será submetida à avaliação médica e social que serão realizadas pela perícia médica e pelo serviço social do Instituto Nacional de Assistência Social – INSS.
7 UM ESTUDO DO DECRETO Nº 6.214, DE 26 DE SETEMBRO DE 2007
O Decreto nº 6.214/ 2007 regulamenta o Benefício de Prestação Continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso conforme dispõe na Lei nº 8.742/93.
O art. 1º do Decreto estabelece:
Art. 1º O Benefício de Prestação Continuada previsto no art. 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso, com idade de sessenta e cinco anos ou mais, que comprovem não possuir meios para prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família.
§ 1º O Benefício de Prestação Continuada integra a proteção social básica no âmbito do Sistema Único de Assistência Social – SUAS -, instituído pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, em consonância com o estabelecido pela Política Nacional de Assistência Social – PNAS.
O INSS é o órgão responsável para verificar preenchimento das condições exigidas para a concessão do benefício, conforme dispõe o art. 3º do Decreto nº 6.214/2007.
Para o reconhecimento do direito ao benefício considera-se idoso aquele com idade de sessenta e cinco ou mais e pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho
O art. 4º, inciso III do Decreto define a incapacidade como:
III – incapacidade: fenômeno multidimensional que abrange a limitação do desempenho de atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de inclusão social, em correspondência à interação entre a pessoa com deficiência e seu ambiente físico e social.
A deficiência e o grau de incapacidade serão comprovados pela avaliação médica social. A avaliação médica da deficiência e do grau de incapacidade considerará as deficiências nas funções e estruturas do corpo, e avaliação social considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais e ambas considerarão a limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social. (§ 2º do art. 16 do Decreto nº 6.215/2007).
A pessoa com deficiência ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de incapacidade, com base nos princípios da Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF – estabelecida pela Resolução da Organização Mundial da Saúde nº 54.21 aprovada pela 54ª Assembléia Mundial da Saúde. (art. 16 do Decreto nº 6.214/2007).
Observa-se que este decreto inovou quando inseriu o benefício na proteção básica do Sistema Único de Assistência Social – SUAS – e exigiu a sua integração às políticas setoriais de âmbito nacional, estaduais e municipais (saúde, segurança alimentar, habitação e educação), para a plena atenção à pessoa com deficiência e à pessoa idosa beneficiárias do BPC.
Há de salientar que houve um grande avanço a respeito das condições exigidas para as pessoas acessarem o benefício. Quanto à avaliação da deficiência e o grau de incapacidade, como acima citado, será com base na CIF e será composta de avaliação médica e social.
Outra observação que se faz e, que é muito significativa, é que o desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais, bem como a realização de atividades não remuneradas de habilitação e de reabilitação não constituem motivos de suspensão ou cessação do benefício.
Sendo atendidos todos os requisitos legais e regulamentares exigidos para a sua concessão o benefício será devido e o seu pagamento deverá ser efetuado em até quarenta e cinco dias depois de cumpridas as exigências.
Se for indeferido o benefício caberá recurso para a Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência social, no prazo de trinta dias, a contar da comunicação. Todavia, não há exigência de esgotamento da via administrativa para que o postulante busque a prestação jurisdicional tendo em vista que não é condição para a propositura de ação de natureza previdenciária o exaurimento da vida administrativa.
CONCLUSÃO
Como ressaltado e enaltecido pela nossa Carta Maior, verifica-se que a dignidade da pessoa humana é um valor supremo e alicerce para a construção de uma sociedade firme e bem estruturada, portanto deverá ser sempre respeitada.
Como valor absoluto que é, impõe-se como consectário a submissão aos direitos fundamentais, assegurando condições dignas de existência para todos.
Para isso, há de haver um efetivo esquema de proteção da pessoa humana, em especial, para as pessoas que se encontram em estado de penúria.
Na tentativa de proporcionar e garantir essa proteção, o texto constitucional trouxe em seu bojo, explicitamente no art. 203 os objetivos da assistência social.
A prestação da assistência social foi regulamentada pela Lei nº 8.742/93, que tem como característica principal a possibilidade de seus programas e benefícios serem usufruídos por qualquer pessoa, independentemente de contribuição, desde que atendidos os requisitos nela previstos.
As condições necessárias para obter a assistência nos termos da lei são: que a pessoa seja impossibilitada de ter vida independente e que a família seja considerada incapacitada para prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa, esta com a idade igual ou superior a 65 anos.
É considerada hipossuficiente para prover a pessoa necessitada, a família cuja renda per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo, o que traz indignação, pois esse parâmetro está muito aquém para atender os mínimos sociais e às necessidades básicas das pessoas.
Há de se considerar que o Governo, quando instituiu outros benefícios como a bolsa família estabeleceu que as famílias que se encontram na faixa de renda per capita de até meio salário mínimo, poderiam se cadastrar, o que demonstra claramente um tratamento diferenciado e injusto em relaçao aos necessitados que dependem da ação da previdência para sobreviverem.
Por outro lado, a jurisprudência já tem sedimentado que a exigência de a renda per capita ser inferior a ¼ do salário mínimo deve ser interpretada dentro do conjunto de leis que trata da assistência social aos necessitados, pois não pode admitir parâmetros diversos para as mesmas situações. Esse posicionamento tem contribuído e muito para a concessão do benefício.
Outro ponto que merece ser observado com veemência é o que se refere à incapacidade para a vida independente. O INSS, autarquia responsável pela operacionalização do Benefício de Prestação Continuada, age com muito rigor quanto a esse quesito, faz uma leitura fria e simplista da lei, pois considera pessoa portadora de deficiência aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, conclui-se que tal entendimento leva ao estrangulamento na concessão do benefício.
Ocorre porém, que com a edição do Decreto nº 6.214/2007 esse rigor foi mitigado, tendo em vista que ao regulamentar a Lei nº 8.742/93 traz em seu contexto uma definição de incapacidade mais abrangente, o que viabiliza a concessão do benefício para aqueles deficientes com acentuada redução de capacidade de inclusão social.
Estabeleceu-se ainda nesse decreto, que a avaliação da deficiência e o grau de incapacidade se dará com base nos princípios da Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF, e será composta de avaliação médica e social. Esta considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais, aquela considerará as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo e ambas considerarão a limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social.
Espera-se que essas medidas otimizem a concessão do benefício aos necessitados, aliviando-os do estado de penúria em que se encontram, contribuindo para sua inclusão social e a possibilidade de alcançar uma existência digna.
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