Fernando Corrêa Alves Pimenta Lima
1 - CONCEITO
A desaposentação é definida como a reversão da aposentadoria obtida no Regime Geral de Previdência Social, ou em Regimes Próprios de Previdência de Servidores Públicos, com o objetivo exclusivo de possibilitar o recebimento de benefício mais vantajoso no mesmo ou em outro regime previdenciário, ou seja, é a possibilidade do segurado renunciar à aposentadoria com o intuito de obter benefício mais vantajoso financeiramente.
Esse instituto pode existir em qualquer regime previdenciário desde que tenha como objetivo a melhoria da condição econômica do associado. O intuito da desaposentação é liberar o tempo de contribuição utilizado para a aquisição da aposentadoria, que modo que esse tempo fique livre e desimpedido para averbação em outro regime ou mesmo para o mesmo benefício no mesmo regime, o que ocorre quando o segurado após aposentar-se continua laborando.
Havendo mudança de regime previdenciário, a contagem recíproca entre regimes distintos é garantida pela Constituição Federal, artigo 201, § 9º, que estabelece:
Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na Administração Pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei.
A desaposentação no mesmo regime previdenciário, geralmente o RGPS, é requerida pelo segurado que após aposentar-se continua trabalhando por vários anos, mantendo a contribuição prevista no artigo 12, § 4º, Lei nº 8.213/91, sem, contudo, nenhum acréscimo em seu benefício.
Entretanto, a desaposentação não possui previsão legal, motivo pela qual é negada pelos órgãos administrativos, que fundamentam suas decisões no Decreto 3.048/99, que veda a renúncia da aposentadoria. Os regimes próprios de previdência são também omissos quanto a questão, no máximo tratando da reversão, que é um instituto distinto, pois visa o retorno ao labor remunerado no cargo público com a perda do benfício previdenciário, no interesse da Administração pública, mero ato discricionário da mesma.
A desaposentação, como o próprio nome esclarece, restringue-se ao desfazimento dos benefícios da aposentadoria, excluindo outros benefícios. Afastando também o benefício da aposentadoria por invalidez, por motivos óbivios.
As aposentadorias por idade, por tempo de contribuição e especial podem ser objeto da desaposentação. Sendo a renúncia mais comum nos caos de aposentadoria por tempo e contribuição, pois é o benefício onde os segurados geralmente aposentam-se mais novos, e geralmente retornam ao mercado de trabalho, pois devido a sua idade e a aplicação do fator previdenciário, seus benefícios são reduzidos, e consequentemente há uma diminuição no padrão de vida dos segurados, o que os obrigam a retornar ao mercado de trabalho.
Não há nenhum entrave quanto a renúncia dos benefícios de aposentaoria por idade, uma vez que a idade avançada não é óbice, podendo o requerente continuar a trabalhar, e consequentemente voltar a contribuir e se quiser renunciar a benefício com a intenção de conseguir novo benefício mais vantajoso.
Quanto ao benefício de aposentadoria especial, o segurado pode retornar ao mercado de trabalho, desde que não exerça atividade que o exponha a agentes nocivos, poderá computar este tempo ao tempo da aposentadoria especia e obter benefício mais vantajoso.
No RPPS tais condições também se aplicam, podendo ser aplicadas no desfazimento do seu benefício visando a obtenção de seu tempo de contribuição, o que poserá ser feito tanto nas aposentadorias voluntárias como na aposentaoria compulsória, visando aposentadoria mais vantajosa no RGPS.
2 - DO DESFAZIMENTO DO ATO CONCESSÓRIO DA APOSENTADORIA
O ato de concessão da aposentadoria, após percorridas todas as fases, assume a condição de ato jurídico perfeito.
Como afirma Celso Antônio Bandeira de Mello, o ato administrativo é perfeito quando esgotadas as fases necessárias à sua produção. Portanto, o ato perfeito é o que completou o ciclo necessário à sua formação. Perfeição, pois, é a situação do ato cujo processo está concluído.( BANDEIA DE MELLO, celso Antônio, Curso de Direito Administrativo, 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997., p. 272).
O ato jurídico perfeito e o direito adquirido são cláusulas pétreas, portanto, imodificáveis até mesmo por emendas constitucionais. Tal preceito tem o evidente propósito e resguardar direitos individuais e coletivos, mantendo-os a salvo de eventuais mudanças legislativas. O ato jurídico perfeito surge no próprio contexto do direito adquirido, pois este é óbito por meio daquele, especialmente no direito previdenciário.
A questão previdenciária também é abrangida pelo ato jurídico perfeito quando da concessão da aposentadoria, tem o propósito de assegurar o benefício do segurado em razão dos seus vários anos de trabalho e contribuição. Sendo que a denegação do ato jurídico perfeito contraria a segurança jurídica, o que geraria uma situação de extrema insegurança ao aposentado, caso seu benefício pudesse ser revisto a qualquer momento, reconsiderando os requisitos de elegibilidade previdenciários, frequentemente alterados.
Entretanto, o ato jurídico perfeito e a segurança jurídica não pode ser um impedimento ao livre exercício de um direito, muito pelo contrário, pois essas garantias constitucionais devem preservar o direito dos aposentados, o qual pode e deve ser renunciado em favor de uma situação mais benéfica.
Por outro lado, a renuncia à aposentadoria não implica em renúncia ao próprio tempo de serviço/contribuição que serviu para a concessão do benefício, pois esse já é direito incorporado ao patrimônio do trabalhador, mas renúncia ao benefício, tendo como intuito o recebimento de benefício financeiramente melhor, ou seja, trata-se de direito patrimonial, portanto, de caráter disponível.
Esse também é o entendimento do e. Superior Tribunal de Justiça:
.“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO PARA AVERBAÇÃO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL.
1. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, por se tratar de direito patrimonial disponível, é cabível a renúncia a benefício previdenciário, com a expedição da certidão do tempo de serviço respectivo, ainda que visando à obtenção de nova aposentadoria em outro regime previdenciário, na medida em que não existe vedação legal à prática de tal ato pelo titular do direito. (Cf. STJ, AGRESP 497.683/PE, Quinta Turma, Ministro Gilson Dipp, DJ 04/08/2003; RESP 423.098/SC, Quinta Turma, Ministro Gilson Dipp, DJ 14/10/2002, e RESP 370.957/SC, Quinta Turma, Ministro Jorge Scartezzini, DJ 15/04/2002; TRF1, AC 1999.01.00.113171-5/GO, Primeira Turma Suplementar, Juiz Manoel José Ferreira Nunes, DJ 08/05/2003; AC 96.01.56046-7/DF, Segunda Turma, Juiz convocado Antônio Sávio de Oliveira Chaves, DJ 10/08/2001; AC 2000.01.00.063411-9/DF, Primeira Turma, Juiz Antônio Sávio de Oliveira Chaves, DJ 04/06/2001; REO 1998.01.00.074740-8/DF, Segunda Turma, relator para acórdão o Juiz Jirair Aram Meguerian, DJ 31/05/2001; AC 1997.01.00.046010-1/DF,Primeira Turma, relator para acórdão o Juiz Carlos Olavo, DJ 29/05/2000, e AMS 96.01.40728-6/DF, Primeira Turma, Juiz Aloísio Palmeira, DJ 03/05/1999.)
2. Apelação e remessa oficial improvidas”.
( AMS 1998.01.00.070862-9 /RO, JUIZ FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER SOARES (CONV.), PRIMEIRA TURMA SUPLEMENTAR, DJ 11 /09 /2003 P.63).
O entendimento de que a renúncia à aposentadoria é um direito disponível do qual o titular não pode ser licitamente privado já se encontra firmemente consolidado no âmbito do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, através de inúmeros julgados, como demonstram os Acórdãos abaixo mencionados:
“EMENTA - PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA À APOSENTADORIA.
I- O segurado tem direito de, a qualquer momento, renunciar à aposentadoria.
II- Sendo legítimo o direito de renúncia, seus efeitos têm início partir de sua postulação.
III- Apelação e remessa oficial improvidas.”
(AC nº 1999.01.00.032520-4/MG – RELATOR: EXMO. JUIZ CARLOS OLAVO).
“EMENTA - ADMINISTRATIVO - MANDADO DE SEGURANÇA - SERVIDOR PÚBLICO CELETIÁRIO APOSENTADO - RENÚNCIA À APOSENTADORIA PREVIDENCIÁRIA PARA CONCESSÃO DE NOVA, PAGA PELO TESOURO NACIONAL - POSSIBILIDADE - SEGURANÇA CONCEDIDA.
1- Sendo a renúncia, em sentido jurídico, abandono ou desistência do direito, portanto, ato unilateral, independe da anuência de terceiro.
2- Lídimos a renúncia à aposentadoria previdenciária e o cômputo do tempo de serviço para obtenção da estatutária.
3- Apelação provida.
4-Sentença reformada.
5- Segurança concedida.
(MAS Nº 95.01.30804-9/DF, RELATOR EXMO. JUIZ CATÃO ALVES, DJ 14.12.98, P. 71).
Portanto, as garantias constitucionais, entre elas a inviolabilidade do ato jurídico perfeito, têm como destinatários os indivíduos que delas possam usufruir em seu proveito, sendo totalmente distorcida a interpretação contrária aos interesses daqueles que são objeto de sua proteção.
3 - DA RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS
Admitindo-se a desaposentação, surge o maior problema referente a esse instituto, a devolução de todos os valores recebidos a título de benefício previdenciário. Essa devolução, sem sombra de dúvida, inviabilizava o instituto da desaposentação.
Parte da doutrina e da jurisprudência ainda adotam a posição de devolução dos valores recebidos durante a aposentadoria. Nesse sentido segue parte de um dos comentários de Maria Vasquez Duarte:
Com a desaposentação e a reincorporação do tempo de serviço antes utilizado, a autarquia seria duplamente onerada se não tivesse de volta os valores antes recebidos. Já que terá que conceder nova aposentadoria mais adiante, ou terá que expedir certidão de tempo de contribuição para que o segurado aproveite o período em outro regime previdenciário.
Com a expedição da certidão de tempo de contribuição, a Autarquia Previdenciária terá de compensar financeiramente o órgão que concederá a nova aposentadoria, nos termos dos arts. 94 da Lei nº 8.213/91 e 4º da Lei nº 9796, de 05.05.99.
(...)
O mais justo é conferir efeito ex tunc à desaposentação e fazer retornar o status que ante, devendo o segurado restituir o recebido do órgão gestor durante todo o período que esteve beneficiado. Este novo ato que será deflagrado pela nova manifestação de vontade do segurado deve ter por conseqüência a eliminação de todo e qualquer ato que o primeiro ato possa ter causado para a parte contrária, no caso o INSS.( DUARTE, Maria vasquez, Temas Atuis de Direito Previdenciário e Assistência Social; Livraria do Advogado Editora; Porto Alegre; 2003. Apud Társis Nametala jorge, http://www.fdc.br/artigos/direito-adquirido.htm, em 23/01/2008).
Algumas decisões judiciais também seguem tal entendimento:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. REGIME DE FINANCIAMENTO DO SISTEMA.
ARTIGO 18, § 2º DA LEI 8.213/91: CONSTITUCIONALIDADE. RENÚNCIA. POSSIBILIDADE. DIREITO DISPONÍVEL. DEVOLUÇÃO DE VALORES. EQUILÍBRIO ATUARIAL. PREJUÍZO AO ERÁRIO E DEMAIS SEGURADOS.
1. Dois são os regimes básicos de financiamento dos sistemas previdenciários: o de capitalização e o de repartição. A teor do que dispõe o artigo 195 da Constituição Federal, optou-se claramente pelo regime de repartição.
2. É constitucional o art. 18, § 2º da Lei nº 8.213/91 (com a redação dada pela Lei nº 9.528/97), ao proibir novos benefícios previdenciários pelo trabalho após a jubilação, mas não impede tal norma a renúncia à aposentadoria, desaparecendo daí a vedação legal.
3. É da natureza do direito patrimonial sua disponibilidade, o que se revela no benefício previdenciário inclusive porque necessário prévio requerimento do interessado.
4. As constitucionais garantias do direito adquirido e do ato jurídico perfeito existem em favor do cidadão, não podendo ser interpretado o direito como obstáculo prejudicial a esse cidadão.
5. Para utilização em novo benefício, do tempo de serviço e respectivas contribuições levadas a efeito após a jubilação originária, impõe-se a devolução de todos os valores percebidos, pena de manifesto prejuízo ao sistema previdenciário e demais segurados, com rompimento do equilíbrio atuarial que deve existir entre o valor das contribuições pagas pelo segurado e o valor dos benefícios a que ele tem direito.
(TRF 4º; Rel. Juiz Néfi Cordeiro; Processo 2000.71.00001821-5; 6ª Turma; Data da decisão 07/08/2003)
Entretanto, não há necessidade de devolução de valores, nem no caso de desaposentação no mesmo regime previdenciário, no qual não há nenhum argumento que sustente a devolução, pois como visa benefício posterior, somente agregará ao cálculo o tempo de contribuição obtido posteriormente, sem invalidar o passado.
No caso da desaposentação visando aposentação em outro regime previdenciário, surge uma dúvida acerca da necessidade de restituição dos valores percebidos, uma vez que se o segurado deixa o regime de origem, levando suas reservas acumuladas para outro regime previdenciário, deveria o segurado ressarcir o regime originário pelos gastos que sustentou. Entretanto, como os regimes previdenciários públicos brasileiros não são regimes de capitalização individual, ou seja, de acumulação de capitais em conta individual, variando o benefício conforme o valor e o tempo de acumulação, não há o que se falar em restituição, uma vez que o custeio é realizado dentro do sistema de pacto intergeracional, com a população atualmente ativa sustentando os benefícios dos hoje inativos, ou seja, o Poder Público não aplica os recursos advindos das contribuições dos segurados visando o futuro, ao contrário do sistema de capitalização, mas utiliza-os no momento de seu efetivo pagamento. Portanto, não há o que se falar em restituição.
Esse também é o entendimento de CASTRO E LAZZARI, que afirmam:
“Entendemos que não há necessidade da devolução dessas parcelas, pois não havendo irregularidade na concessão do benefício recebido, não há o que ser restituído. Como paradigma, podemos considerar a reversão, prevista na Lei nº 8.112/90, que não prevê a devolução dos proventos percebidos.”
Levando-se em consideração a reversão prevista na Lei 8.112/90, a analogia com o instituto da desaposentação é válida, pois em ambos os casos a restituição é indevida, em razão da renúncia ao benefício.
Portanto, além do caráter alimentar do benefício previdenciário, a restituição nos casos de desaposentação é indevida, pois tal desconto só é admissível em regimes de capitalização individual, que não existe no sistema previdenciário puro.
No sentido favorável a não-restituição de valores percebidos há vários julgados, já sendo praticamente pacífica em alguns tribunais tal entendimento:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA PELO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL - RENÚNCIA. CONTAGEM DE TEMPO PARA FINS DE APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. ART. 96, INC. III, DA LEI 8.213/91. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA.
1. Remessa oficial, tida por interposta de sentença proferida na vigência da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997. Não incide, na hipótese, o § 3º do artigo 475 do CPC, tendo em vista que a sentença não se fundamentou em jurisprudência do plenário ou súmula do Supremo Tribunal Federal, ou tribunal superior competente.
2. O art. 96, inc. III, da Lei 8.213/91 impede a utilização do mesmo tempo de serviço para obtenção de benefícios simultâneos em sistemas distintos, e não da renúncia a uma aposentadoria e concessão de certidão de tempo de serviço para obtenção de aposentadoria estatutária.
3. Inexiste vedação a renúncia de benefício previdenciário e conseqüente emissão de contagem de tempo de serviço para fins de averbação desse período junto a órgãos públicos, a fim de obter-se aposentadoria estatutária, por mais vantajosa, sem que o beneficiado tenha que devolver qualquer parcela obtida em decorrência de outro direito regularmente admitido, conforme pacífica jurisprudência. Precedentes (EIAC 2000.34.00.029911-9/DF, RESP 692.628/DF e RMS 14.624/RS).
4. O exame da questão incide sobre direito subjetivo do autor, não importando aumento de vencimentos ou extensão de vantagens a servidores públicos sob fundamento de isonomia, vedados pela Súmula nº 339 do Supremo Tribunal Federal.
5. Apelação a que se nega provimento.
(AC 2002.34.00.006990-1/DF, 2ª Turma do TRF1ª Região, Des. Aloísio Palmeira Lima, Publicação 26/04/2007, p. 15).
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DA SENTENÇA. SUSPENSÃO DA APOSENTADORIA PARA EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL COM RETRIBUIÇÃO MAIS VANTAJOSA. POSSIBILIDADE.
1. "Somente a ausência de fundamentação, não ocorrente na espécie, é que enseja a decretação de nulidade da sentença com base no art. 458, II, não a fundamentação sucinta". (RESP 255271/GO, rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA).
2. O segurado tem direito de, a qualquer momento, obter a suspensão do pagamento da aposentadoria a fim de perceber vencimento de atividade laboral mais vantajosa.
3. Essa renúncia temporária aos proventos resguarda os interesses da pessoa humana e independe da aquiescência da Autarquia Previdenciária.
4. Apelação e remessa oficial não providas.
(AC 1999.01.00.046460-6/DF, 2ª Turma TRF1, Juiz Federal (convocado) Carlos Alberto Simões Tomaz, DJ 09/06/2005, p. 64)
Portanto, a restituição dos valores percebidos está deixando de ser um obstáculo a desaposentação, como isso a desaposentação vem se tornando um meio eficaz para aqueles que pretendem voltar ao mercado de trabalho com o intuito de perceber benefício mais vantajoso.
4 - DA PREVISÃO LEGAL EXPRESSA
A desaposentação não possui previsão legal expressa, sendo este o principal argumento da Administração Pública para negar a aplicação do instituto. Entretanto, também não há previsão legal proibindo a utilização de tal instituto.
O Poder Público distorce a correta aplicação do Princípio da Legalidade, uma vez que o administrado pode fazer tudo, desde que não proibido por lei; entretanto, a Administração Pública só fará aquilo que estiver previsto em lei, não podendo a Administração Pública impor ditames legais aos administrados, podendo somente impor suas restrições através de lei.
DI PIETRO é um dos autores partidários de tal posição, dizendo resumidamente que a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo (como um regulamento), conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto, ela depende de lei.( DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito Admiistrativo. 13ª ed. São Paulo; Atlas, 1999, p. 68).
A ausência de previsão legal para o exercício das prerrogativas inerentes à liberdade da pessoa humana, não pode ser alegada pela Administração Pública como entrave à desaposentação, visto que cabe à pessoa, desde que perfeitamente capaz, julgar a condição mais adequada para sua vida, aposentado ou não.
Portanto, como a desaposentação visa interesse exclusivo do aposentado, seja pelo RGPS ou mesmo algum regime próprio de previdência, a Administração Pública não pode negar a aplicação de tal instituto, pelo simples fato do mesmo não estar previsto expressamente em lei.
5 - QUESTÕES PROCESSUAIS
A competência para julgamento da ações relativas a desaposentação, conforme artigo 109, I da CF/88, é privativa da Justiça Federal, figurando no pólo passivo da presente demanda o Instituto Nacional do Seguro Social, isso no caso de renúncia a benefício do RGPS.
No caso da desaposentação onde o regime de origem seja o próprio de qualquer dos entes federados, dependerá justamente de qual ente federado o servidor estiver vinculado. No caso do servidor vinculado a regime de previdência dos estados ou dos municípios, a competência será da Justiça Estadual, enquanto que o servidor federal será a justiça federal.
Quando o domicílio dos segurados não for sede da Justiça Federal, a ações poderão ser processadas e julgadas perante a Justiça Estadual, ou no foro da Justiça Federal na capital do respectivo estado da federação.
A desaposentação, conforme Lei 10.259/01, pode ser proposta perante o Juizado Espeial Federal, nas causas em que o valor não exceda sua competência, ou seja, 60 salários mínimos. Não havendo Vara Federal a caus pode ser julgada no Juizado Especial Federal mais próximo do foro definido no artigo 4 da Lei 9.099/95.
Por outro lado, o requerimento administrativo continua a ser item obrigado para o ajuizamento de praticamente todas as ações previdenciárias, sob pena de falta de interesse de agir, sendo julgado carecedor de ação, devido a ausência de conflito de interesse.
Entretanto, a simples comprovação do requerimento administrativo, sem resposta no tempo hábil, já é documento comprobatório da recusa do INSS. O requerimento administrativo torna-se desnecessário, quando comprova-se que a autarquia já tem possicionamento pacífico acerca da questão, como é o caso da desaposentação.
A desaposentação pode ser objeto de tutela antecipada, conforme estabelece o artigo 273 do Código de Processo Civil, desde que comprovados todos os seus requisitos.
6 - CONCLUSÃO
Depois de analisar os principais aspectos da desaposentação, não resta dúvida de que a mesma é constitucional, inexistindo qualquer vedação expressa à opção do segurado em renunciar ao benefício de origem, desde que tenha como intuito a obtenção de benefício mais vantajoso.
O Princípio da Legalidade não deixa dúvidas acerca da possibilidade do segurado optar pela renúncia do benefício para a obtenção de outro mais vantajoso, uma que o administrado/segurado pode fazer tudo, desde que não proibido por lei, ao contrário da Administração Pública, que somente fará aquilo que estiver previsto em lei, não podendo a Administração Pública impor ditames legais aos administrados, podendo somente impor suas restrições através de lei.
Ficou demonstrado, também, que o instituto da desaposentação não causa nenhum tipo de prejuízo ao equilíbrio atuarial do sistema, pois as contribuições posteriores ao benefício não estavam previstas, não havendo nenhum obstáculo para a revisão atuarial. O mesmo acontece quando o segurado deseja ingressar em novo regime previdenciário. O regime previdenciário de origem, geralmente o RGPS, não sofrerá prejuízos, pois irá deixar de efetuar os pagamentos ao segurado, vertendo recursos acumulados ao regime próprio, mediante compensação financeira, devendo-se levar em consideração o fato de que o montante arrecado será utilizado em período temporal menor, já que a expectativa de vida do segurado será reduzida.
Entretanto, deve-se fazer outra ponderação acerca o equilíbrio atuarial e a necessidade de devolução dos valores percebidos a título de aposentadoria, pois, conforme já mencionado, os regimes previdenciários públicos brasileiros não são regimes de capitalização individual, ou seja, de acumulação de capitais em conta individual, variando o benefício conforme o valor e o tempo de acumulação. Assim, não há o que se falar em restituição, uma vez que o custeio é realizado dentro do sistema de pacto intergeracional, com a população atualmente ativa sustentando os benefícios dos hoje inativos, ou seja, o Poder Público não aplica os recursos advindos das contribuições dos segurados visando o futuro, ao contrário do sistema de capitalização, mas utiliza-os no momento de seu efetivo pagamento; portanto, não há o que se falar em restituição, nem em desequilíbrio atuarial.
Enfim, não se pode negar que a desaposentação visa uma melhora no bem estar do segurado, garantindo a ele uma aposentadoria mais vantajosa do que anteriormente recebia, melhorando sua qualidade de vida e de seus dependentes, indo ao encontro do que estabelece a Constituição Federal, ao garantir o direito a vida, a dignidade, ao trabalho.
Portanto, o instituto da desaposentação está totalmente sintonizado com os preceitos constitucionais mais nobres, desde que requerido com o intuito de benefício mais vantajoso, no RGPS ou em qualquer outro regime previdenciário.
7 - BIBLIOGRAFIA
BRAMANTE, Ivani Contini. Desaposentação e Nova Aposentadoria. Revista de Previdência Social, nº 244, março/2001.
CASTRO, Alberto Pereira de Castro e LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. São Paulo: LTr, 6ª edição, 2005.
DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito Admiistrativo. 13ª ed. São Paulo; Atlas, 1999.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação O Caminho Para Uma Melhor Aposentadoria. Impetus, 2ª edição, 2007.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário, Lúmen Júris, 9ª edição, 2007.