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Pensão por Morte: A responsabilidade civil do Estado pela prática de atos ilícitos de seus servidores

VICTOR RIODRIGUES FILHO

 

1. INTRODUÇAO

 

A Lei nº. 8.213, de 21 de julho de 1991, que dispõe sobre planos e benefícios da Previdência Social, prevê no art. 75 a pensão por morte.

 

Desta forma cabe a autarquia federal – o INSS- o dever de conceder o benefício previdenciário, desde que preenchidos seus requisitos, aos dependentes do segurado que venha a falecer.

 

Porém, resta dúvida quando a morte do segurado é ocasionada por ato ilícito proveniente do Estado.

 

Logo, o estudo proposto tem por objeto a art. 121 da Lei nº. 8.212/91 combinado com o art. 37 §6º da Constituição da Republica, que na sua exegese responsabiliza objetivamente o Estado por prejuízos causados por seus agentes em face de terceiros.

 

Pelos dispositivos legais, pretende-se analisar quais as conseqüências causadas quando a morte de um segurado é decorrente de um ato ilícito gerado pelo próprio estado.

 

2. PENSÃO POR MORTE

 

A pensão por morte é o seguro que visa cobrir o risco social morte bem como garantir aos dependentes do segurado os meios indispensáveis à sua subsistência.

 

Nas palavras de Fábio Zambitte Ibrahim “é o benefício direcionado aos dependentes do segurado, visando a manutenção da família, no caso da morte do responsável pelo seu sustento [...]aposentado ou não.( IBRAHIM, 2003)

 

3. REQUISITOS

 

A concessão da pensão por morte ao dependente do segurado esta autorizada no art. 74 da Lei nº. 8.213/91 e depende dos seguintes requisitos:

Qualidade de segurado do de cujus à época do falecimento

 

A qualidade de dependente(Os dependentes do segurado são aqueles descritos no art. 16 da Lei nº. 8.213/91. Veja-se: I- O cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21(vinte e um) anos ou inválido; II- os pais; III- o irmão não emancipado de qualquer condição, menor de 21(vinte e um) anos ou inválido.

 

Interessante notar que, conquanto a lei nada mencione, já há o entendimento de se possibilitar a concessão do benefício pensão por morte às pessoas que mantém união homoafetiva em nada ofendendo o § 3º do art. 16 do mesmo dispositivo. Nos seguintes termos da ementa:

PENSÃO POR MORTE. RELACIONAMENTO HOMOAFETIVO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. MINISTÉRIO PÚBLICO. PARTE LEGÍTIMA. (STJ; REsp 395.904; PROC. 2001/0189742-2; RS; 6º T.; Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa; DJU 06/02/2006; p. 365)) daquele que requer o benefício previdenciário.

 

Embora a lei exija a qualidade de segurado à época do óbito é interessante notar a existência de um precedente que permitiu a concessão do benefício com inscrição efetuada posterior à data do falecimento: 

PENSÃO POR MORTE – EMPREGADO DOMÉSTICO- FILIAÇAO- INSCRIÇÃO POST MORTEM – POSSIBILIDADE- CUSTAS PROCESSUAIS- JUSTIÇA ESTADUAL-SÚMULA Nº. 2/ TARGS. 1-O empregado doméstico inclui-se no rol dos segurados obrigatórios da previdência social conforme o disposto no art. 11, II, da Lei nº. 8.213/91, e da sua filiação decorre automaticamente do exercício de atividade remunerada, consoante o disposto no art. 17 do regulamento vigente à época (Decreto nº. 611/92). 2-Comprovado o exercício de atividade remunerada que determine a filiação automática, a inscrição do segurado obrigatório pode ser efetuada após o seu óbito, de modo que os seus dependentes têm direito à pensão por morte. Precedentes da corte. 3-Custas processuais reduzidas por metade, visto tratar-se de ação ajuizada na justiça estadual, a teor do disposto na súmula nº. 02 do extinto TARGS. (TRF 4º R-AC 1998. 04.01.043984-8-RS 6º T. REL. JUIZ NYLSON PAIM DE ABREU – DJU 15.03.200).

 

4. CONCESSÃO

 

A concessão do benefício ocorre em razão do evento morte do segurado e em nada altera se o mesmo estava ativo ou se já estava aposentado.

 

O óbito poderá ser real ou presumido.

 

Ocorrerá óbito real se houver materialidade do fato, ou seja, um corpo ausente de vida. A partir da comprovação do óbito real estrai-se a sua certidão que prestará como início de prova para a concessão do benefício.

 

O óbito presumido, nos termos do art. 78 da Lei nº. 8.213/91, ocorrerá nas seguintes formas.

 

A) Com o desaparecimento do segurado por um interregno de 06 meses pode-se instaurar uma ação de reconhecimento de ausência e obter a prolação de uma declaração judicial; (“RECURSO ESPECIAL. PENSÃO. MORTE PRESUMIDA. COMEPETÊNCIA. 1- O reconhecimento da morte presumida do segurado, com vistas à percepção de benefício previdenciário (art.78 da Lei nº. 8.213/91) não se confunde com a declaração de ausência prevista no Código Civil e Código de Processo Civil, razão pela qual compete à justiça federal processar e julgar a ação. 2- Recurso conhecido e provido”. (STJ, 6º Turma, REsp 256547/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU, p. 303, de 11/9/2000).

 

B) Através de substrato que prove o desaparecimento do segurado em acidente, desastre ou catástrofe, sem a necessidade de declaração judicial.( Como prova do desaparecimento: a) boletim do registro de ocorrência feito junto à autoridade policial; b) prova documental da presença do segurado no local da ocorrência; c) noticiário nos meios de comunicação; d) CAT juntamente com o parecer médico-pericial caso haja nexo entre a ausência e o trabalho exercido pelo segurado).

 

Note-se que o óbito presumido é precário, porquanto a sua concessão pode ser cessada no momento em que o segurado reaparecer.

 

4.1. Inicio da Concessão do Benefício

 

A data de início do benefício será:

do óbito quando requerida:

pelo dependente maior de 16 anos de idade, até 30 dias depois do infortúnio;

pelo dependente menor de 16 anos de idade até 30 dias depois de completar essa mesma idade.

do requerimento da pensão por morte caso seja solicitada 30 dias depois o infortúnio;

da prolação da decisão judicial, no caso de morte presumida.

 

Pelo visto foi resguardado o direito do menor de 16 anos de idade tendo 3m vista que contra eles não correm prazos decadenciais ou prescricionais. Estes prazos começam a correr para os menores quando completam 16 anos ou se emancipam.

 

Quanto aos efeitos do requerimento, serão ex tunc e ex nunc.

 

Será ex tunc, ou retroativo à data do óbito quando o requerimento for feito dentro do prazo de até 30 dias do óbito para o maior de 16 anos.

 

Terá o mesmo efeito, outrossim, para aquele dependente, menor de 16 anos que fizer o requerimento até 30 dias após ter completado essa idade.

 

Não que ambos terão seu direito extinto se fizerem o requerimento após este interregno. Explico. É que, feito desta maneira o efeito do requerimento não retroagirá, bem como ainda será devido, embora seja à partir da data em que for solicitado.

 

Será de efeito ex nunc o início da concessão do benefício e devido no momento do requerimento quando o dependente, maior der 16 anos, proceder ao pedido 30 (trinta) dias após o óbito do segurado.

 

4.2. Concessão Após a Perda da Qualidade de Segurado

 

A perda da qualidade de segurado incorre, outrossim, a perda da concessão de pensão aos dependentes.

 

Porém, não ocorrerá caso: 

segurado à época da morte tenha implementado todos os requisitos para consecução de uma aposentadoria – seja aposentadoria por invalidez, aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial.

Seja reconhecida, ainda na manutenção extraordinária da qualidade de segurado, a incapacidade permanente ou temporária do ex-segurado.

 

5. VALOR DO BENEFÍCIO

 

Podem ocorrer duas situações.

 

Caso o segurado esteja ativo à época do óbito o valor do benefício a ser concedido ao dependente será de 100% do valor da aposentadoria por invalidez a que teria direito. Se o segurado estiver aposentado à época do óbito o valor do benefício a ser concedido ao dependente será de 100% do valor da aposentadoria que recebia.

 

6. CUMULAÇÃO

 

Com outra pensão por morte:

É vedado, podendo o dependente (cônjuge ou companheiro, neste caso) optar pela mais vantajosa. A falta de previsão legal possibilita a contração, pelo dependente, de novo casamento ou estabelecimento de novo vínculo de companheirismo sem prejuízo do recebimento de benefício.

 

b) Com aposentadoria:

 

É possível tendo em vista que a MP 1.473-33/97, que proibia este recebimento simultâneo, foi revogada.

 

7. CARÊNCIA

 

Não há tendo em vista que é um benefício que protege o dependente e não o segurado.

 

8. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

 

8.1 Conceito

 

A responsabilidade civil do Estado pode ser denominada pelos diversos doutrinadores como responsabilidade patrimonial do Estado, responsabilidade extracontratual do Estado, responsabilidade civil da administração, responsabilidade patrimonial extracontratual do Estado. Celso Antônio Bandeira de Mello utiliza a denominação responsabilidade patrimonial extracontratual e formula o conceito 

 

“Entende-se por responsabilidade patrimonial extracontratual do Estado a obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os dados lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos.” (MELLO, 2003).

 

Hely Lopes Meirelles prefere à denominação responsabilidade civil da Administração Pública a responsabilidade civil do Estado, pois, para ele, a responsabilidade surge de atos da Administração, e não de atos do Estado como entidade política.  Segundo o seu conceito 

 

“Responsabilidade civil da Administração é, pois, a que impõe à Fazenda Pública a obrigação de compor o dano causado a terceiros por agentes públicos, no desempenho de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las.” (MEIRELLES, 2004).

 

8.2 Evolução da Responsabilidade Civil do Estado

 

A evolução da responsabilidade civil do Estado passou por três teorias: teoria da irresponsabilidade, teorias civilistas (teoria dos atos de império e de gestão; e teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva) e teorias publicistas (teoria da culpa administrativa, teoria do risco administrativo e teoria do risco integral).

 

A seguir, abordar-se-á cada uma dessas teorias.

 

8.2.1 Teoria da Irresponsabilidade

 

Por esta teoria, o Estado não possui qualquer tipo de responsabilidade de indenizar.  Maria Sylvia Zanella Di Pietro explica que esta teoria estava ligada à soberania do Estado, conforme se verifica a seguir (2004: p.549): 

 

“O Estado dispõe de autoridade incontestável perante o súdito; ele exerce a tutela do direito, não podendo, por isso, agir contra ele; daí os princípios de que o rei não pode errar (the king can do no wrong; le roi ne peut mal faire) e o de que “aquilo que agrada ao príncipe tem força de lei” (quod principi placuit habet legis vigorem). Qualquer responsabilidade atribuída ao Estado significaria colocá-lo no mesmo nível que o súdito, em desrespeito a sua soberania”. (DI PIETRO, 2004).

 

Tal teoria perdurou nos Estados absolutistas até a adoção do Estado de Direito (século XIX) com a separação dos poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário). A teoria da irresponsabilidade foi sendo abandonada e aos poucos a teoria da responsabilidade com culpa foi sendo adotada. 

 

8.2..2. Teorias Civilistas

 

Quando se passou a admitir responsabilidade do Estado foram adotados princípios do direito civil. Inicialmente verifica-se a teoria dos atos de império e de gestão que posteriormente evolui para a teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva. Passaremos a discorrer sobre elas nos subitens a seguir:

 

8.2.2.1. Teoria dos Atos de Império e de Gestão

 

Esta teoria distinguia os atos de império dos atos de gestão. Os atos de império eram praticados de forma unilateral e coercitiva e eram, em regra, de autoria do Monarca.   Os atos de gestão eram praticados por prepostos do Estado e eram atos praticados em situação de igualdade para com os particulares. Aos primeiros não se atribuía responsabilidade, já que ao Rei não se podia atribuir erros (the king can do no wrong). Já aos atos praticados pelos prepostos (atos de gestão), passou-se a admitir a responsabilidade civil. Nota-se que esta teoria é um abrandamento da teoria da irresponsabilidade, mas também foi muito criticada diante da dificuldade ou impossibilidade de separar os atos de império dos atos de gestão. 

 

8.2.2.2. Teoria da Culpa Civil

 

A teoria da culpa civil, também chamada de teoria da responsabilidade subjetiva, pressupõe a existência de culpa e esta deveria ser provada. Tal prova torna-se bastante difícil como bem comenta Odete Medauar: 

 

“..., transferiu-se para a atuação administrativa o sentido de culpa, elaborando-se a idéia de que o Estado repararia o dano se fosse comprovado o mau funcionamento, o não funcionamento do serviço, a falha da Administração (culpa publicista ou culpa anônima). Essa concepção acarretava para vítima o encargo da prova do mau funcionamento ou da falha, muito difícil de realizar, sobretudo por demandar um padrão de funcionamento previamente estabelecido, que em geral não existe.” (MEDAUAR, 2004).

 

Apesar se serem passíveis de críticas, não se pode negar que as teorias civilistas trouxeram uma evolução ao possibilitar de alguma forma a responsabilização do Estado que anteriormente era insuscetível de ser atingido.

 

8.2.3. Teorias Publicistas

 

As teorias publicistas de responsabilização do estado tiveram origem jurisprudencial no caso Blanco. Um pai, da cidade de Bordeaux, conseguiu a responsabilização do Estado francês pelo atropelamento de sua filha. É a evolução da responsabilidade subjetiva para a responsabilidade objetiva na qual se torna desnecessária a demonstração da culpa do agente. 

 

Hely Lopes Meirelles, em seu livro Direito Administrativo Brasileiro, estabelece três correntes que tratam da responsabilidade objetiva do Estado ou responsabilidade objetiva da Administração Pública, nas palavras do renomado autor. As três correntes têm suas variações em seus fundamentos e em sua aplicação.   São elas: Teoria da Culpa Administrativa, Teoria do Risco Administrativo e Teoria do risco integral. Nos subitens a seguir verificaremos cada uma de forma sintética.

 

8.2.3.1. Teoria da Culpa Administrativa

 

Esta teoria relaciona-se com a falta do serviço. Ou seja, diante de tal falta, um dano causado a terceiro gera a obrigação de indenizar. O problema é que fica a cargo da vítima provar que ocorreu a falta do serviço, o que é bastante difícil. A falta do serviço, segundo ensinamento de Paul Duez, citado por Hely Lopes Meirelles(MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro29 ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 626) “pode apresentar-se sob três modalidades: inexistência do serviço, mau funcionamento do serviço ou retardamento do serviço. Ocorrendo qualquer destas hipóteses, presume-se a culpa administrativa e surge a obrigação de indenizar”.

 

Portanto, a culpa é presumida da falta administrativa.

 

8.2.3.2. Teoria do Risco Administrativo

 

Enquanto na teoria da culpa administrativa exige-se a falta do serviço causando danos ao particular para gerar a obrigação de indenizar, na teoria do risco administrativo basta que a administração pública cause dano ao particular sem o concurso deste. Assim preleciona Hely Lopes Meirelles: 

 

“Aqui não se cogita da culpa da Administração ou de seus agentes, bastando que a vítima demonstre o fato danoso e injusto ocasionado por ação ou omissão do Poder Público. Tal teoria, como o nome está a indicar, baseia-se no riscotima demonstre o fato dnoso e injusto ocasionado por responsabilidade subjetiva que a atividade pública gera para os administrados e na possibilidade de acarretar dano a certos membros da comunidade, impondo-lhes um ônus não suportado pelos demais. Para compensar essa desigualdade individual, criada pela própria Administração, todos os componentes da coletividade devem concorrer para a reparação do dano através do erário, representado pela Fazenda Pública.” (MEIRELLES, 2004).

 

Diferentemente da teoria do risco integral que será apresentada no próximo subitem, a teoria do risco administrativo admite que o Estado prove a culpa da vítima com o objetivo de eximi-lo total ou parcialmente da indenização.

 

8.2.3.3. Teoria do Risco Integral

 

Pela teoria do risco integral o Estado seria responsabilizado por danos mesmo que houvesse culpa ou dolo da vítima. Por ser extremada, esta teoria não apresentou aplicabilidade. Vejamos o comentário de Hely Lopes Meirelles: 

 

“A teoria do risco integral é a modalidade extremada da doutrina do risco administrativo, abandonada na prática, por conduzir ao abuso e à iniqüidade social. Por essa fórmula radical, a Administração ficaria obrigada a indenizar todo e qualquer dano suportado por terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo da vítima. Daí por que foi acoimada de “brutal”, pelas graves conseqüências que haveria de produzir se aplicada na sua inteireza”. (MEIRELLES, 2004).

 

Após a síntese evolutiva acima apresentada, passaremos a analisar a responsabilidade civil no Estado na Constituição Federal.

 

8.3. A Responsabilidade Civil do Estado na Constituição da República de 1988

 

A Constituição da República em seu artigo 37 § 6º estabelece: 

 

 “As pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. (BRASIL. Constituição da República (1988). Coleção Saraiva de Legislação. 35º ed. atualizada e ampliada.São Paulo: Saraiva, 2005.p.41)

 

Da análise do dispositivo supracitado, depreende-se que a Constituição de 88 orientou-se pela Doutrina do Direito Público e optou pela responsabilidade civil objetiva da Administração, sob a modalidade do risco administrativo (MEIRELLES, 2004)

 

9. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO PELA PRÁTICA DE ATO ILÍCITO

 

Como dito algures o benefício pensão por morte é aquele devido aos dependentes do segurado pela ocorrência do risco social morte

 

Acontece que, deveria a autarquia federal suportar este encargo de pagar o benefício pensão se a morte de seu segurado fosse ocasionada por um ato ilícito do Estado praticado por seus servidores?

 

Não se deve olvidar que os recursos repassados ao INSS são provenientes da sociedade, posto que, o artigo 195 da Constituição da República determina como financiadores a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como as contribuições pagas pelos empregados e pelos empregadores dentre outras fontes de custeio estabelecidas na Carta Magna e leis infraconstitucionais.

 

Desta forma, a prática de um ato ilícito praticada pelo Estado estaria onerando injustificadamente aqueles que contribuem para a previdência.

 

Como exemplo trazemos à colação a ementa do julgado do TRF 1º região em que a relatora, a Desembargadora Federal Maria Isabel Gallotti Rodrigues decidiu situação que ilustra perfeitamente o estudo o qual nos propomos: 

Previdenciário e Civil. Responsabilidade Civil. Ato Ilícito Praticado por Policial Militar, Dentro de Delegacia de Polícia, Contra Segurado da Previdencia Social. Ação Regressiva Ajuizada pelo INSS contra o Estado de Minas Gerais. Denunciação da Lide. Cabimento.

1. [...]. 2.Tem o INSS legitimidade e interesse para ajuizar ação a fim de reaver as despesas decorrentes da concessão de benefício previdenciário aos dependentes do segurado, vítima de assassinato. 3. Responde civilmente o Estado de Minas Gerais pelo assassinato de pessoa dentro de Delegacia de polícia (art. 37§ 6º, da CF/88). 4. No risco que deve ser repartido por toda sociedade não se incluem os prejuízos causados por ato ilícito. 5. Tendo em vista os fatos provados e confessados pelo autor do crime, é de se entender deva ele ressarcir o Estado de Minas Gerais pelo pagamentos efetuados ao INSS pela pensão por morte concedida aos dependentes da vítima. Denunciação da lide julgada procedente. 6 [...].

(TRF 1º R.; AC 2001.01.00.017523-2; MG; 6ºT.; Rel. Des. Fed. Maria Isabel Gallotti Rodrigues; DJU 27/03/2006; p.91).

 

Vejamos. O INSS interpôs apelação com intuito de reformar a sentença de primeira instância que julgou improcedente ação de regresso contra o Estado de Minas. Procurava-se condenar o Estado a repor aos cofres da autarquia os valores que seriam dispendidos com o pagamento da pensão por morte aos dependentes do segurado.

 

Aplica-se neste caso a responsabilidade objetiva do Estado em que para configurá-la basta apenas a ocorrência do fato, o dano sofrido pelo lesado e o nexo de causalidade.

 

Uma vez que ocorreu o dano há a necessidade de repará-lo. A reparação traduz através de uma indenização. No caso em tela, o dano sofrido recaiu sobre o INSS que deveria conceder a pensão por morte ao dependente do segurado sendo que sua morte não foi de causas naturais, mas provocada por um servidor público.

 

Houve a necessidade então de denunciar a lide. Como a pessoa jurídica responsável pelo evento morte do segurado foi o Estado de Minas o INSS pretendeu pedir a condenação do mesmo pelos gastos com a concessão da pensão, pois entendia que não era admissível que toda a sociedade arcasse com a conseqüência do ilícito.

 

Há o entendimento(Maria Sylvia Zanella Di Pietro, adota a posição de Yussef Said Cahali. Ob. Cit.p, 367) de que a denunciação da lide somente é possível se for possível a identificação do agente. Caso a culpa fosse anônima não haveria de se utilizar do instituto processual. Nada mais lógico.

 

Situação curiosa é que o Estado de Minas intentou ação de regresso contra o Sargento que provocou a morte do segurado. O Direito de regresso “é assegurado ao Estado no sentido de dirigir sua pretensão indenizatória contra o agente responsável pelo dano, quando tenha este agido com dolo ou culpa” (CARVALHO FILHO, 2004)

 

Houve aqui duas relações que envolviam o Estado. A primeira é entre o INSS e o Estado de Minas. Foi necessária a denunciação da lide. Agora, o direito de regresso permeou após a denunciação, ou seja, no momento em que o Estado teve o propósito de ser ressarcido pelo servidor pelos pagamentos a serem efetuados ao INSS. Essa seria a segunda relação, qual seja, entre o Estado de Minas e o servidor que causou o dano.

 

A Desembargadora observando o desenrolar do processo julgou procedente ambos os pedidos que seriam o pedido de denunciação da lide e o direito de regresso.

 

10. CONCLUSÃO

 

Tendo em vista o demonstrado acima podemos concluir que o Estado pode responder pelo pagamento do benefício de pensão por morte nos casos em que seus servidores praticarem atos ilícitos e desde que possam ser identificados.

 

Não cabe ao Estado eximir-se de sua responsabilidade tendo em vista que o evento morte foi causado pela prática de um ato ilícito perpetrado por um de seus agentes.

 

Ainda que a autarquia federal seja uma das pessoas da Administração Pública leva-se em conta que os seus recursos arrecadados não se confundem com os recursos da administração direta. Concordar com o entendimento de que à autarquia nada é devido seria onerar esta em razão de um ato que o qual não lhe recai a responsabilidade. Não se pode onerá-la em razão de um ato que não lhe diz respeito.

 

Pode também o Estado neste caso valer-se do direito de regresso contra o servidor a fim de ser ressarcido pelos gastos pagos com a concessão do benefício.

 

O direito de regresso, antes de tudo, procura onerar o responsável direto pelo pagamento da indenização. Note-se que, a ação de regresso não traz qualquer prejuízo para o agente direto causador do dano e buscando aplicar os princípios que regem essa matéria. É a busca da proteção do patrimônio do administrado através da responsabilidade do Estado.

 

11. BIBLIOGRAFIA

BRASIL. Constituição da República (1988). Coleção Saraiva de Legislação. 35º ed. atualizada e ampliada.São Paulo: Saraiva, 2005.

CARVALHO FILHO, JOSÉ DOS SANTOS. Manual de Direito Administrativo.11º ed. Rio de Janeiro:Lumen Iuris, 2004.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2004.

IBRAHIM, FÁBIO ZAMBITTE. Curso de Direito Previdenciário. 3º ed. Editora Impetus. Rio de Janeiro: 2003.

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.