Análise de precedentes: Visão monocular presume deficiência para fins de aposentadoria

Visão monocular: reconhecimento legal como deficiência leve garante aposentadoria diferenciada.

A Lei nº 14.126/2021 trouxe uma importante mudança ao reconhecer a visão monocular como uma deficiência sensorial, do tipo visual, para todos os efeitos legais. Desde então, há uma discussão jurídica no sentido de como essa classificação impacta a concessão de benefícios do INSS. Nesse artigo, vamos tratar especialmente da Aposentadoria da Pessoa com Deficiência, prevista na Lei Complementar nº 142/2013.

Trataremos das regras para esse tipo de aposentadoria, dos critérios de comprovação e também traremos uma análise de precedentes recentes que consolidam o entendimento de que a visão monocular presume deficiência leve para fins previdenciários.

 

Quem pode receber a aposentadoria da pessoa com visão monocular?

A pessoa com visão monocular tem direito às regras diferenciadas de aposentadoria destinadas às pessoas com deficiência, previstas na Lei Complementar nº 142/2013.
Em geral, essa condição é classificada como deficiência leve, o que permite duas modalidades de aposentadoria:

 

1. Por tempo de contribuição (deficiência leve)

  • 28 anos de contribuição, para mulheres;

  • 33 anos de contribuição, para homens.

2. Por idade (deficiência leve)

  • 55 anos de idade e 15 anos de contribuição, para mulheres;

  • 60 anos de idade e 15 anos de contribuição, para homens.

 

Em ambos os casos, é necessário que o tempo mínimo de contribuição tenha sido cumprido na condição de pessoa com deficiência. Ou seja, a pessoa precisa ter trabalhado com a deficiência ocular. 

Mas, atenção! No art. 70-E do Decreto 3.048/99 há uma tabela para conversões de períodos trabalhados com e sem deficiência. Assim, mesmo que a pessoa não tenha trabalhado a vida inteira com a visão monocular, pode ter direito à aposentadoria da pessoa com deficiência.

 

Como é classificada a visão monocular?

Considera-se visão monocular quando a visão em um dos olhos é igual ou inferior a 20%.
O diagnóstico é realizado por médico oftalmologista, com base em critérios técnicos de acuidade visual.

Antes de solicitar o benefício, é fundamental que o segurado já possua exames e atestados médicos comprovando a deficiência visual.

 

Valor da aposentadoria

As regras de cálculo para aposentadoria por deficiência não foram alteradas pela Reforma da Previdência (EC nº 103/2019):

  • Aposentadoria por tempo de contribuição: 100% da média de todos os salários de contribuição desde julho de 1994.

  • Aposentadoria por idade: 70% da média, acrescido de 1% a cada grupo de 12 contribuições, até o máximo de 30%.

Além da redução no tempo de contribuição ou idade mínima, a fórmula de cálculo costuma gerar vantagem econômica significativa.

 

Como provar a visão monocular?

O INSS realiza perícia médica e avaliação social, utilizando o Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria (IFBrA).
No entanto, em muitos casos a visão monocular não é reconhecida como deficiência na avaliação administrativa, resultando em indeferimento administrativo.

Nessas situações, é necessário entrar com um processo judicial, apresentando laudos médicos e solicitando nova perícia.
Como veremos a seguir, a jurisprudência tem sido firme em reconhecer que basta comprovar a existência da visão monocular para presumir a deficiência leve, afastando a necessidade do IFBrA para esse enquadramento.

 

Análise dos precedentes

TRF4 – Reconhecimento presumido de deficiência leve

 

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. REQUISITOS E CRITÉRIOS DIFERENCIADOS. ARTS. 6º E 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO. ARTS. 2º E 3º DA LC 142/2003. GRAUS DE DEFICIÊNCIA. 1. A Constituição Federal prevê a aposentadoria aos segurados do Regime Geral da Previdência Social com deficiência, mediante adoção de requisitos e critérios diferenciados, consoante seu art. 201, § 1º, regulado, no plano infraconstitucional, pela Lei Complementar 142/2003. 2. Na conformidade da jurisprudência deste Tribunal, o segurado portador de visão monocular é considerado pessoa com deficiência. (TRF4, AC 5023010-82.2023.4.04.7000, 10ª Turma, Relator para Acórdão MÁRCIO ANTONIO ROCHA, julgado em 24/06/2025)

 

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. [...] APOSENTADORIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VISÃO MONOCULAR. DEFICIÊNCIA DE GRAU LEVE. [...]. 4. De acordo com precedentes desta Corte Regional, nas turmas previdenciárias, tributárias e administrativas, o segurado portador de visão monocular é considerado pessoa com deficiência. Para fins previdenciários tal limitação classifica-se como deficiência leve, fazendo jus o segurado à aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência, de acordo com os critérios da Lei Complementar n.º 142/2013, se implementados os demais requisitos legais. (TRF4, AC 5042886-48.2022.4.04.7100, 6ª Turma, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, julgado em 23/10/2024)rma, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, julgado em 23/10/2024)

 

Perceba-se que para a jurisprudência do TRF4 o diagnóstico da visão monocular configura, automaticamente, deficiência leve para fins de aposentadoria da pessoa com deficiência.

 

TRF3 – Prescindibilidade do IFBrA 

 

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. LEI COMPLEMENTAR Nº 142/2013. VISÃO MONOCULAR. AVALIAÇÃO DA DEFICIÊNCIA. IFBRA. PRESCINDIBILIDADE. CONCESSÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER. JUROS DE MORA. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PROVIDO EM PARTE.

[...] 2. A Lei Complementar nº 142/2013 dispõe ainda, nos seus art. 4º e 5º, que a avaliação da deficiência será médica e funcional, nos termos do regulamento, e que o grau de deficiência será atestado por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social, por meio de instrumentos desenvolvidos para esse fim.

3. A visão monocular foi classificada como deficiência sensorial, do tipo visual, para todos os efeitos legais, por força da Lei nº 14.126/21.

4. O Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria - IFBrA, estabelecido na Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP nº 1 de 27.01.2014, é destinado à avaliação e à identificação dos graus de deficiência do segurado da previdência social, nos termos do art. 1º da sua norma regulamentadora, e constitui o instrumento específico previsto no art. 5º da LC nº 142/2013.

5. Em sendo o Juiz o destinatário da atividade probatória das partes, a qual tem por finalidade a formação de sua convicção sobre os fatos controvertidos, no exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 370 do CPC, incumbe-lhe aquilatar a necessidade da prova dentro do quadro dos autos, com vistas à justa e rápida solução do litígio, deferindo ou não a sua produção. A comprovação da existência ou não da deficiência, nesse sentido, prescinde de forma específica e pode ser realizada por meio do emprego de todos os meios legais ou moralmente legítimos, em face da necessidade de se preservar o valor da justiça da prestação jurisdicional.

6. É possível o reconhecimento da deficiência em grau leve, para os efeitos da LC nº 142/13, independentemente da aplicação do IFBrA, porém é indispensável este índice para a caracterização da deficiência em seus graus moderado ou grave. Precedentes desta E. Corte.

[...]

(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5073881-41.2021.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal MARCOS MOREIRA DE CARVALHO, julgado em 30/04/2025, Intimação via sistema DATA: 05/05/2025)

 

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. DEFICIÊNCIA DE GRAU LEVE COMPROVADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

[...]

3. A aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa com deficiência é devida ao segurado que comprove os seguintes requisitos: a) 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte), se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; b) 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro), se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; c) 33 (vinte e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito), se mulher, no caso de segurado com deficiência leve. Necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado.

4. No caso dos autos, mostra-se comprovada a condição de segurada com deficiência leve, uma vez que a visão monocular passou a ser caracterizada como deficiência sensorial do tipo visual por expressa previsão legal - Lei nº 14.126/2021 - garantindo-se todos os direitos inerentes a tal condição. A data de início da deficiência deverá ser a data em que a segurada completou 05 anos de idade (06.04.1981), conforme apreciação administrativa.

[...]

(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000484-21.2023.4.03.6137, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 14/05/2025, DJEN DATA: 16/05/2025)

 

O TRF3 também possui julgados presumindo a deficiência leve em decorrência da visão monocular e destacando a prescindibilidade do IFBrA nesses casos.

 

Conclusão

Os precedentes dos TRFs mostram que é possível a presunção da visão monocular como deficiência leve para fins de aposentadoria, sendo suficiente a comprovação médica da condição para garantir o enquadramento nas regras diferenciadas de aposentadoria da LC nº 142/2013, dispensando o IFBrA nesse caso específico.

 

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Colunista desde 2024

Sobre o autor desse conteúdo

Dr. Lucas Cardoso

Formado em Direito pela Universidade Franciscana (UFN), Lucas Cardoso Furtado é especialista em Direito Previdenciário.

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