TRF3 reconhece vínculo de empregada doméstica com base em julgamento com perspectiva de gênero

TRF3 reconhece vínculo trabalhista e garante aposentadoria a empregada doméstica com base em julgamento com perspectiva de gênero.

Em importante precedente na seara previdenciária, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região deu provimento à apelação de uma segurada empregada doméstica, reconhecendo integralmente o vínculo trabalhista prestado entre 08/04/1973 e 12/04/1979, mesmo com rasura na CTPS, e determinando a concessão da aposentadoria por idade.

A decisão foi por maioria, com voto condutor da Desembargadora Federal Inês Virgínia, que destacou a necessidade de análise da prova sob enfoque interseccional e a aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, previsto na Resolução CNJ nº 492/2023.

O caso: vínculo doméstico e prova fragilizada pela informalidade estrutural

A autora apresentou carteira de trabalho com anotação de vínculo como empregada doméstica, cuja data de término estava rasurada. Apesar disso, a CTPS apresentava ordem cronológica e registro coerente com outros vínculos anotados. O INSS reconheceu apenas o período de 08/04/1973 a 31/12/1974, por não considerar válida a anotação com rasura, o que inviabilizaria o cumprimento da carência mínima para a concessão do benefício.

A prova oral colhida em audiência de instrução confirmou de forma uníssona e coerente que a autora exerceu atividade doméstica durante todo o período alegado (1973 a 1979), fato determinante para o convencimento do colegiado.

O voto vencedor realçou que a informalidade e a precarização do trabalho doméstico impõem barreiras probatórias historicamente ignoradas pelo sistema de justiça, de modo que, sem uma leitura sensível à realidade das trabalhadoras, decisões judiciais podem acabar reproduzindo desigualdades de gênero e raça.

Julgar com perspectiva de gênero: da teoria à prática

A decisão afirma expressamente que o julgador deve considerar a realidade histórica e social das trabalhadoras domésticas, cuja categoria só obteve direitos previdenciários básicos a partir da Lei nº 5.859/72 e equiparação parcial apenas com a Emenda Constitucional nº 72/2013. O voto destaca ainda que a rasura em documento não pode ser utilizada como critério absoluto de invalidação, quando o conjunto probatório aponta para a veracidade da relação de trabalho.

Tese de julgamento fixada no acórdão:

1. Anotação em CTPS com rasura pode ser admitida como início de prova material do vínculo de trabalho, desde que corroborada por prova testemunhal idônea.
2. A aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero impõe a consideração das desigualdades estruturais enfrentadas por mulheres, especialmente trabalhadoras domésticas, autorizando mitigação das exigências formais de prova.
3. A comprovação do tempo de serviço, ainda que parcialmente informal, permite a concessão da aposentadoria por idade urbana, desde que preenchidos os requisitos legais à data do requerimento administrativo.

TRF3: APELAÇÃO CÍVEL Nº 5568123-92.2019.4.03.9999

 

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