Como garantir a concessão de Auxílio-Acidente via Mandado de Segurança
Quando o INSS erra no Direito, o Mandado de Segurança corrige o caminho.
Em muitos pedidos de concessão de Auxílio-Acidente o INSS reconhece a redução da capacidade ao trabalho, porém o benefício é indeferido sob o argumento de que a limitação seria de “grau leve” ou “médio”, e não “grave”, ou de que não haveria enquadramento da lesão no rol do Anexo III do Decreto 3.048/99.
Leia também:
Recentemente, me deparei com um indeferimento nesse sentido, o qual trouxe dois fundamentos para a negativa:
-
Redução funcional apenas de grau médio;
-
Inexistência de enquadramento no rol do Anexo III.
Para solucionar a demanda, ao invés de ingressar com uma ação “ordinária” de concessão de auxílio-acidente, optei por impetrar Mandado de Segurança.
A suposta exigência de “grau máximo” de limitação
No processo administrativo, o próprio laudo pericial do INSS reconheceu que o segurado apresenta redução da capacidade para o trabalho em virtude de acidente de qualquer natureza. Apesar disso, o benefício foi negado sob o fundamento de que a limitação seria apenas de grau médio.
Ocorre que é entendimento consolidado que o nível de limitação é irrelevante para a concessão de auxílio-acidente. O Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese no Tema 416:
Exige-se, para concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido. O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão.
Em outras palavras, basta que haja redução da capacidade laborativa, ainda que mínima, para a concessão de auxílio-acidente (satisfeitos os demais requisitos).
Rol exemplificativo
Ademais, o INSS também justificou que a lesão do segurado não se enquadraria no Anexo III do Decreto nº 3.048/99, que traz uma lista de situações que permitem o deferimento de auxílio-acidente.
Entretanto, também é matéria pacífica na jurisprudência que a ausência de enquadramento da lesão no Anexo III do Decreto nº 3.048/99 não impede a concessão de auxílio-acidente. Vejam o seguinte precedente:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. EXISTÊNCIA. TEMA 416 STJ. ANEXO III DO DECRETO N. 3.048/99. ROL EXEMPLIFICATIVO. [...] 3. Para a concessão do benefício de auxílio-acidente, não há obrigatoriedade da lesão encontrada estar enquadrada em alguma das situações elencadas no Anexo III do Decreto n. 3.048/99, visto que o rol não é exaustivo, apenas exemplificativo. (TRF4, AC 5002655-75.2023.4.04.9999, 9ª Turma, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, julgado em 18/04/2023, com grifos acrescidos)
Por que o Mandado de Segurança foi o caminho adequado
No caso, optei pela via do Mandado de Segurança pois a questão discutida é puramente de direito, sem necessidade de nova prova pericial. O INSS não indeferiu o benefício por ausência de nexo ou de inexistência de limitação funcional, mas sim por matérias de direito há anos pacificadas.
Assim, o pedido não busca rediscutir fatos ou provas, mas sim a reabertura do processo administrativo para que o próprio INSS promova a correção do ato mediante reanálise, eis que a decisão contrariou o Tema 416/STJ e exigiu enquadramento da lesão no rol do Anexo III como requisito indispensável ao deferimento do benefício.
Liminar concedida!
Ao elaborar a Petição Inicial, formulei o seguinte pedido liminar:
O deferimento da Tutela Provisória de Urgência Antecipada, in limine litis, a fim de que seja determinada à autoridade coatora a imediata reabertura do processo administrativo para que profira nova decisão, considerando que o grau (mínimo, médio ou máximo) de limitação não interfere no direito ao Auxílio-Acidente, o qual deverá ser concedido ainda que a lesão cause redução mínima da capacidade ao trabalho (Tema 416/STJ), e que a ausência de enquadramento da lesão no Anexo III do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99) não obsta a concessão de Auxílio-Acidente, desde que comprovada a redução da capacidade ao trabalho decorrente de acidente de qualquer natureza
Recebido o feito, juízo de origem deferiu a tutela de urgência, nos seguintes termos (grifei):
Ao que se depreende do laudo, o impetrado reconheceu a existência de sequela definitiva decorrente de acidente e a redução da capacidade para o trabalho, mas indeferiu o benefício pelo não enquadramento do caso nas situações elencadas no Anexo III do Decreto nº 3.048/99.
Nos termos do entendimento jurisprudencial prevalente, ainda que a redução da capacidade da Parte Autora não esteja prevista no Anexo III do Decreto n.º 3.048/1999, o Regulamento é meramente exemplificativo. Vale salientar que o Anexo prevê a "relação das situações que dão direito ao auxílio-acidente" (aparelho visual, auditivo, fonação, perdas de segmentos e membros, alterações articulares, desempenho muscular, etc.). Por mais minucioso que possa ser, não tem como abranger todas as situações em que há redução da capacidade. Trata-se, portanto, de rol exemplificativo, que não caracteriza numerus clausus [...].
Por fim, saliento que há decisão transitada em julgado na análise do tema repetitivo nº 416 pelo STJ, com a fixação da seguinte tese [...].
Assim, resta configurada a probabilidade do direito a ensejar o deferimento da medida liminar requerida, relativamente à reanálise do pedido, à luz do entendimento supra.
O perigo de dano reside na natureza alimentar do benefício pretendido.
Ante o exposto, defiro em parte o pedido de provimento liminar, determinando à autoridade coatora que, em prazo não superior a 10 dias, reabra o processo administrativo referente ao PROTOCOLO DE REQUERIMENTO XXXXXXXXX Data de entrada: XX/XX/XXXX, NB XXX.XXX.XXX-X, e proceda à reanálise do pedido de concessão do auxílio-acidente, observando que o rol constante do Anexo III do Decreto nº 3.048/91 é meramente exemplificativo e a decisão do STJ na análise do Tema 416 que implica no deferimento do benefício em apreço ainda que mínima a lesão que causou a redução da capacidade laborativa de forma definitiva.
Como visto, o Mandado de Segurança é um caminho extremamente útil quando o indeferimento do INSS decorre de matéria de direito, e não de questão fática-probatória.
Em situações como a narrada, em que há satisfação de todos os requisitos mas o INSS aplica o direito de forma equivocada, o(a) advogado(a) pode buscar a correção do ato sem necessidade de perícia judicial (afinal, não se busca reanalisar fato já reconhecido pelo INSS).
Petição
Finalizando, vou deixar o link do modelo de Mandado de Segurança que elaborei na mencionada ação:
Grande abraço e até a próxima!